sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Tarifa - Com África ali tão perto

Quem escolhe visitar a cidade espanhola de Tarifa aproveita muitas vezes para experimentar algumas das praias que ficam nas proximidades. Foi também o que fizemos nas duas vezes que visitámos a cidade, fomos percorrendo a costa mais meridional da península, espreitámos as praias que nos iam aparecendo, e escolhemos logo a Playa del Faro de Trafalgar, ou Farol de Trafalgar, ainda a meio-caminho entre Cádis e Tarifa.

A praia pareceu-me interessante, nada comparável com as nossas praias, sobretudo pela qualidade das areias (eu sou um grande fã das praias portuguesas e raramente sou surpreendido, a menos das baleares, mas isso é outro mundo). A praia faz uma extensa baía e tem a imagem do farol ao longe, que a torna mais bonita… e nem é muito ventosa, como acontece ao longo da costa mais próxima de Tarifa.

Assim, deu para uns banhos de sol e para uns mergulhos, que são sempre retemperadores nas terras quentes da Andaluzia, numa praia rodeada por bonitas paisagens.

Já mais próximo da Tarifa voltámos a desviar até à praia, agora numa daquelas praias ventosas, a Playa de los Lances, que é um dos ex-libris desta zona, sempre escolhidas pelos praticantes de windsurf e, mais recentemente, de kitesurf. Aqui ficámos só a apreciar o vento quente no rosto e a imagem dos muitos kites coloridos que ali vão preenchendo o azul do céu.

Mas Tarifa tem também as suas praias em plena cidade, não são tão radicais, mas têm a particularidade de se poder escolher entre uma praia atlântica e outra mediterrânica, bastando, para isso, atravessar o estreito caminho que separa estes dois mares… e que mais tarde iríamos visitar.


Para entrar na cidade, e no seu Casco Antiguo, escolhemos a porta das muralhas, a chamada Puerta de Jerez, um dos monumentos emblemáticos de Tarifa e um símbolo da reconquista da cidade aos mouros. 

A cidade de Tarifa foi considerada um enclave estratégico no período da presença muçulmana e foram estes que ergueram as robustas muralhas que circundavam a cidade, das quais a Puerta de Jerez faz parte. Com a reconquista e a chegada dos cristãos, as muralhas foram ainda ampliadas devido ao crescimento da população e a Puerta de Jerez continuou a ser a principal entrada na cidade velha, e tem sido assim até aos dias de hoje.
Entrando na cidade encontramos um conjunto de ruelas apertada e labirínticas, as casas muito brancas e muitos recantos por onde nos deixamos vaguear sem destino ou objetivo.

       
Por entre as ruas surgem sempre algumas praças onde nascem esplanadas de restaurantes com a oferta habitual desta zona, com os pratos típicos andaluzes à base de peixe e marisco, que são acompanhados apropriadamente por umas cervejas ou umas copas de vino blanco.

No meio de todas as ruelas que percorremos sem rumo definido, só pelo prazer de assistir à palpitação deste lugar, vamos encontrando alguns locais especiais, como a Calle San Francisco, um pequeno beco sempre apinhado de turistas e que nos leva até à Iglesia de San Francisco, ou a Calle Sancho IV el Bravo, com acesso à Iglesia de San Mateo, a principal igreja da cidade, construída no início do século XVI sobre os restos de uma antiga mesquita.
            


No próximo mapa estão assinalados alguns dos pontos de passagem, mais ou menos aleatórios, que fomos percorrendo no interior do casco velho da cidade, que em tempos foi protegido por uma muralha contínua, mas onde hoje só encontramos algumas das suas portas. 

Neste mapa são também visíveis os restantes polos de interesse desta cidade, desde logo as praias, que já mencionei, mas também a ilha de las Palomas, que ainda iríamos conhecer, e o imenso porto, o grande motor da economia local e a razão principal para que Tarifa seja uma cidade tão visitada - a maioria dos visitantes estão apenas de passagem e param ali para apanhar um ferry que os vai levar até Tanger.
Saímos, entretanto, do casco velho por uma das suas portas, na Calle Santísima Trinidad, junto ao Mercado Público, e chegámos ao Paseo de la Alameda, um imenso calçadão cheio de palmeiras e outros tipos de árvores, peculiar pelos mosaicos decorativos no seu pavimento. Este é mais um local com muitas esplanadas.

Ao final deste passeio chegamos à zona do porto, onde se ergue o maior dos monumentos da cidade, o Castelo de Santa Catalina.
É a grande fortificação da cidade de Tarifa e o seu principal símbolo. Está localizado numa pequena colina sobre o porto e atinge apenas 24 m acima do nível do mar, mas com uma vista ampla sobre o estreito, o que sempre fez deste castelo um ponto estratégico de defesa. Mesmo nos tempos mais recentes, durante a Segunda Guerra Mundial, o castelo foi utilizado como ponto de controlo das diversas armadas que entravam e saiam do Mediterrâneo, pelo que podem ser encontrados alguns bunkers e nichos com metralhadoras apontados ao mar.
Logo abaixo estende-se o imenso porto, de onde saem e chegam diariamente várias embarcações de todo o tipo, que cruzam o estreito até ao porto de Tânger, num curto trajeto, com pouco mais de 30km, mas que nos leva entre a Europa e a África… um percurso que representa muito mais do que uma simples fronteira, é tantas vezes uma barreira profunda entre dois mundos e duas culturas que, infelizmente, se chega a tornar intransponível.
Quando nos aproximamos do mar, junto às praias, entramos na Calle Segismundo Moret, um caminho sobre a língua de areia que une a cidade à Isla de las Palomas, onde encontramos o ponto mais meridional de toda a Europa continental.
O percurso ao longo deste passadiço tem alguns simbolismos, e não mais do que isso - por estarmos a chegar ao ponto mais a Sul de todo o continente europeu - por estarmos perante dois mares diferentes que se vão juntar logo ali à frente, no final da ilha – por podermos contemplar uma paisagem que nos mostra o outro lado do estreito, que nos parece tão perto, mas que, na realidade, é muitíssimo distante.
E, no regresso, com a vista da cidade ao fundo, aproveitamos a casualidade de estarmos perante dois mares separados por uma estreita língua de areia, com o Mediterrâneo à nossa direita e o Atlântico do lado esquerdo.


E foi ali, entre o Mediterrâneo e o Atlântico, que nos fomos despedindo da cidade de Tarifa, um local que nos transmite muito para além do que seria comum em qualquer outra terra junto ao mar… por representar o fim de um continente, mas também o início de uma aventura por terras africanas, que tantas vez começa bem ali, logo depois daquelas águas, que assinalam a última fronteira para tantas viagens sonhadas.