domingo, 5 de julho de 2015

Bona


Ao fim de cerca de 90 km pelo Vale do Reno, acompanhando o rio na sua descida até ao mar, chegámos à cidade de Bona, a antiga capital da República Federal Alemã, antes da reunificação que se verificou após a queda do muro de Berlim em 1989.

Percorremos o centro histórico da cidade, que não é mais do que um conjunto de edifícios monumentais, dispostos em meia dúzia de praças e ruas bastante bonitas, mas semelhantes às da maioria das cidades alemãs... embora, neste caso, sejam visíveis várias alusões à sua figura maior, o compositor Ludwig van Beethoven.

Resolvemos percorrer a pequena teia de ruas e praças da cidade, com destaque para o seu centro histórico e para a Münsterplatz, onde encontramos a estátua de Beethoven… que nos recebe como anfitrião de quem ali chega.
O percurso que fomos fazendo durante esta tarde começou justamente nas margens do Reno, que tínhamos vindo a seguir de Sul para Norte. Entrámos depois no centro da cidade e seguimos aproximadamente os trajetos representados neste mapa:
 

Mas ainda antes de começar a descrição daquilo que encontrámos nesta cidade, vou recordar um pouco da sua história.

Bona é uma cidade encantadora às margens do Reno, com mais de dois mil anos de história. A sua origem remonta ao tempo dos romanos, que fundaram aqui um acampamento militar por volta do século 11 a.C. Mais tarde, durante a Idade Média, Bona tornou-se residência dos príncipes-eleitores de Colónia e ganhou destaque com a construção do Bonner Münster, uma das catedrais mais antigas da Alemanha.

Nos séculos seguintes floresceu como cidade barroca, enriquecida pelos seus palácios elegantes como o Kurfürstliches Schloss e o Poppelsdorfer Schloss.

No entanto, o nome de Bona ficou especialmente ligado à música, por ter ali nascido, em 1770, o compositor Ludwig van Beethoven, tornando a cidade num destino imperdível para os amantes da cultura.

No século XIX, a cidade reforçou o seu papel académico com a fundação da Universidade, que ainda hoje lhe dá vida e juventude.

Depois da Segunda Guerra Mundial, Bona teve um papel inesperado na história moderna, quando, entre 1949 e 1990, foi decretada como capital da República Federal da Alemanha. Mesmo após a reunificação, e quando Berlim recuperou esse estatuto, Bona manteve-se como “cidade federal”, acolhendo ministérios e organismos internacionais, incluindo agências da ONU.

Hoje, Bona é uma mistura única de passado e presente, combinando ruínas romanas, igrejas medievais e palácios barrocos, com a atmosfera de uma cidade universitária e cosmopolita… mas é sobretudo um lugar onde a música de Beethoven se encontra com a política, a ciência e a vida tranquila que se aprecia junto às margens do seu belo rio, o Reno… por onde começámos o nosso percurso, junto à Ponte Kennedy.
Ainda nas margens do rio o passeio começa junto ao Teatro de Ópera de Bona - Opera House, um dos marcos culturais da cidade, conhecido pelas produções de ópera, concertos e espetáculos de ballet. Uma breve passagem pela praça em frente ao edifício permite admirar a sua arquitetura moderna.

Seguimos depois até à Friedensplatz, uma das praças mais movimentadas e conhecidas da cidade, com espaços pedonais cheios de lojas e preenchidos por esplanadas de cafés e restaurantes. O nome significa “Praça da Paz” e remete à reconstrução da cidade após os difíceis anos da Segunda Guerra. Hoje, é sobretudo um espaço de encontro e de vida quotidiana, e funciona como ponto de passagem para quem circula pelo centro histórico.
A praça também recebe feiras, mercados sazonais e eventos culturais, o que a torna um lugar dinâmico e agradável, tanto para moradores como para visitantes.

Na envolvente deste espaço, que está sempre animado e cheio de comércio de rua, encontramos uma pequena fortaleza, que é chamada de Sterntor Bonn Innenstadt. O Sterntor é um portão histórico construído originalmente em 1244 como parte das muralhas medievais da cidade.
O próximo trajeto é feito pelo Dreieck Bonn, que inclui as ruas comerciais mais animadas do centro da cidade, e fica localizado em torno da Friedensplatz e da Münsterplatz, fazendo parte do coração pedonal de Bona, e onde se concentram várias lojas, cafés e restaurantes.
Na verdade, o nome Dreieck, que significa literalmente “triângulo”, não é o nome oficial de uma rua única, mas sim de um quarteirão de comércio de forma triangular.

Neste conjunto de ruas encontra-se uma mistura de estilos arquitetónicos, entre os prédios modernos, edifícios clássicos e até uma casa de enxaimel, aquelas casas medievais com ripas de madeira nas fachadas.
Saindo deste conjunto de ruas entramos na Münsterplatz, uma das praças centrais mais movimentadas de toda a cidade.

No centro da praça destaca-se a famosa estátua de Beethoven, inaugurada em 1845 por ocasião do 75.º aniversário do nascimento do compositor. Foi um evento histórico, celebrado com a presença de figuras ilustres da época, incluindo a Rainha Vitória do Reino Unido e o compositor Franz Liszt, que apoiou financeiramente a iniciativa.

Por detrás da estátua do mais famoso compositor alemão fica o Altes Postamt Bonn, um edifício amarelo que é o antigo prédio dos correios de Bona. Foi construído em meados do século XVIII, em estilo barroco e foi usado inicialmente como residência de um oficial da corte, mas, mais tarde, foi adquirido pelos serviços postais da cidade.
O nome desta praça vem do Bonner Münster, a imponente catedral românica que se ergue ali perto e que marca fortemente a identidade da cidade.

A catedral Bonn Minster, ou Bonner Münster, é a catedral da cidade e a sua principal igreja católica. Foi construída entre os séculos XI e XIII e é uma das mais antigas igrejas da Alemanha, considerada como um exemplo da arquitetura românica alemã.

Trata-se de um dos monumentos mais importantes e impressionantes de Bona e, mais do que um local religioso, representa um símbolo da cidade, testemunhando mais de 900 anos de história, e tendo sobrevivido a guerras e reconstruções, continuando a ser um espaço de espiritualidade, cultura e identidade para os habitantes locais.

No interior desta igreja, os visitantes encontram um ambiente solene, com belos vitrais, esculturas medievais e a cripta, que guarda relíquias e memórias da sua história.

Mas o seu exterior é muito mais impressionante, sobretudo quando o observamos do lado da Martinsplatz, com as suas torres altas e as fachadas sólidas em pedra, que lhe conferem um ar imponente e austero.
A praça que envolve a igreja, a Münsterplatz, é um ponto de encontro muito animado e um dos principais espaços da vida urbana de Bona… juntando ainda a belíssima imagem desta catedral.
Saímos pela Martinsplatz, seguindo na direção de uma outra praça da cidade, a Remigiusplatz. Esta pequena praça é conhecida sobretudo pela escultura que ali se ergue, chamada de "Mean Average", um monumento de bronze com seis metros de altura, que foi criado pelo escultor britânico Tony Cragg, em 2014.
Pouco depois entramos em mais uma das praças históricas da cidade, a Markt. Desde a Idade Média que esta praça funciona como ponto de encontro e espaço de comércio, onde se realizavam feiras e mercados que animavam a vida da cidade. Ainda hoje mantém essa tradição e, de manhã, a praça enche-se de bancas de frutas, flores, queijos e produtos regionais, criando uma atmosfera típica.

Além das bancas que ocupam o centro da praça, nos edifícios qua a contornam encontram-se cafés, restaurantes e lojas, tornando este espaço num lugar ideal para fazer uma pausa e observar o movimento.

Numa das suas extremidades fica o edifício mais emblemático da Markt, o Altes Rathaus (antiga Câmara Municipal), construído no século XVIII em estilo barroco, com a sua elegante fachada branca e dourada e a escadaria onde já foram recebidas várias personalidades históricas.
Saindo da Markt estamos muito próximo de um dos principais jardins do centro de Bona, o Hofgarten. Trata-se de um espaço amplo ajardinado, que fica localizado entre dois edifícios clássicos e uma igreja.

No lado superior fica o Kurfürstliches Schloss, um imenso palácio de estilo barroco do século XVIII que hoje é utilizado pela Universidade de Bona. A sua fachada imponente e a localização, junto ao relvado do jardim, central fazem dele um dos cartões-postais da cidade.
Do lado oposto do amplo relvado fica o edifício do Instituto de Arqueologia e Museu Académico de Arte da Universidade de Bona.

Numa das laterais deste jardim ergue-se a Evangelische Kreuzkirche Bonn. Foi inaugurada em 1871 e é a maior igreja protestante da cidade, com capacidade para 1.200 pessoas. Foi construída em estilo neogótico com tijolos vermelhos, contendo três naves e uma torre frontal. Foi severamente danificada durante a Segunda Guerra Mundial, mas foi depois reconstruída, já na década de 1950.

Além de espaço de culto, esta igreja tornou-se numa referência cultural e comunitária, conhecida pelos concertos de órgão, música sacra e outros eventos, como o Festival de Beethoven, que ali têm lugar. 
O percurso seguinte foi bastante mais longo, até chegarmos ao Poppelsdorf Palace. Este elegante palácio é hoje um centro de investigação universitária e encontra-se rodeado por um jardim botânico, formando um conjunto bastante bonito.

Trata-se de um edifício barroco construído entre 1715 e 1740 por ordem do príncipe-eleitor Joseph Clemens, da Baviera, que desejava uma residência de Verão fora das muralhas da cidade. A partir do século XIX, o edifício deixou de ter funções residenciais e passou a ser utilizado para fins académicos, contendo várias coleções científicas como minerais, fósseis e exemplares zoológicos.
O nosso percurso continuou depois até ao LVR-LandesMuseum Bonn, o Museu Regional de Bona, onde se encontram exposições de arqueologia, arte e história cultural, desde a pré-história até à atualidade.

A origem deste museu é das mais antigas da Alemanha, tendo sido fundado em 1820 com uma coleção que abrange mais de 400.000 anos de história cultural, desde a pré-história até à atualidade. Entre os destaques encontram-se vestígios arqueológicos da Idade da Pedra, do período romano e da Idade Média, bem como obras de arte desde o Renascimento até ao século XXI.

O museu é especialmente conhecido por peças únicas como o esqueleto do Neandertal de Oberkassel, considerado um dos mais antigos achados de Homo Neanderthalensis na Europa, datado há cerca de 14.000 anos atrás.

Além dos conteúdos deste riquíssimo museu, destacam-se também as belas fachadas, modernistas e envidraçadas, do atual edifício.
Voltámos agora de novo ao Centro Histórico e seguimos depois até à Beethoven-Haus, a casa-museu do compositor, onde pudemos visitar algumas das relíquias do espólio de um dos criadores mais marcantes da história da música.

Ludwig van Beethoven nasceu em Bona em 1770 e desde cedo revelou o seu talento musical. Filho de uma família modesta, recebeu as primeiras lições de piano e violino ainda em criança e, rapidamente, destacou-se como um prodígio. Na juventude trabalhou como músico na corte dos príncipes-eleitores de Colónia, mas foi em Viena que desenvolveu a sua carreira brilhante, tornando-se num dos maiores compositores da história da música. Apesar de enfrentar a surdez progressiva a partir dos 30 anos, criou ainda, depois disso, algumas das obras mais célebres da tradição clássica, como a Nona Sinfonia e a Missa Solemnis.

Beethoven morreu em 1827, mas a sua música continua a ser símbolo universal de genialidade e emoção.
O museu da Beethoven-Haus reúne uma das maiores coleções do mundo dedicadas ao compositor, incluindo instrumentos originais, manuscritos, cartas e objetos pessoais que permitem conhecer de perto a sua vida e obra. Além da exposição permanente, a Beethoven-Haus conta também com uma sala de concertos e um centro de pesquisa, mantendo viva a ligação entre a cidade e o seu filho mais ilustre.

Beethoven ficou conhecido, tanto pela sua magnífica obra, como pela sua surdez, aparentemente incompatível com a criação musical, mas que, neste caso, não o impediu de continuar a compor. Registo, por exemplo, que, na sua última década de vida, numa fase em que já estaria completamente surdo, conseguiu ainda compor 44 obras musicais.

Mas a visita ao museu não nos leva à dimensão do compositor, aliás, nada nos poderia transportar até à grandeza de tal figura a não ser a sua própria música. Por isso, nada será melhor para nos aproximarmos de Ludwig van Beethoven do que escutar atentamente alguma das suas composições, só assim conseguiremos um conhecimento mais profundo sobre o autor de obras-primas como o Hino à Alegria, que faz parte da 9ª sinfonia, ou o concerto para piano Für Elise.
Antes de voltarmos à ponte que atravessa o Reno, junto à qual tínhamos deixado o carro, passámos ainda por mais uma igreja, a Stiftskirche de Bona, uma das igrejas católicas mais antigas e importantes da cidade. O nome significa literalmente “Igreja do Colégio (ou Colegiada)”, porque esteve ligada durante séculos a um capítulo de uma comunidade religiosa formada por cónegos.

O edifício foi construído no período do chamado gótico tardio, entre os séculos XIV e XV, no local de uma antiga capela medieval. Originalmente a igreja era dedicada a São João Evangelista e São João Batista. Ao longo dos séculos a igreja passou por várias transformações, incluindo ampliações e reformas barrocas, mas preservando sempre a sua estrutura gótica e os suas nbelas torres.

Foi assim que terminámos a nossa visita à antiga capital administrativa da chamada República Federal Alemã, ou Alemanha Ocidental. Foi uma paragem curta, estivemos apenas durante uma tarde completa, mas pareceu-me ser o suficiente para conhecer um pouco daquilo que a cidade tem para oferecer. 

O seu centro histórico é bastante interessante, embora muito semelhante a outras cidades alemãs… mas aqui destaca-se particularmente presença da sua figura mais ilustre, o compositor Ludwig van Beethoven, que é a alma omnipresente desta cidade.


Carlos Prestes
Julho de 2015