Saindo da Bélgica, partimos para mais um dia de viagem e para mais um país, o nosso próximo destino seria o Gran Ducado do Luxemburgo.
O Luxemburgo surgiu no século X em torno de um castelo construído pelo Conde Siegfried. Ao longo dos séculos, foi disputado por várias potências europeias, incluindo Espanha, França, Áustria e os Países Baixos, devido à sua posição estratégica. Tornou-se um grão-ducado em 1815 e adquiriu plena independência em 1839. Durante as duas guerras mundiais foi ocupado pela Alemanha, mas, apesar de ser um país muito pequeno, após 1945, tornou-se um dos fundadores da União Europeia, da ONU e da NATO. Hoje, o Luxemburgo é uma monarquia constitucional e um importante centro financeiro e político europeu.

À partida, era daqueles países que não teria sequer razão aparente para existir, está entalado entre a Bélgica, a França e a Alemanha, e parece ser um bocado de terreno que ninguém quis. Mas a realidade é diferente, o Luxemburgo desempenhou sempre um papel geoestratégico naquela zona da europa, funcionando, muitas vezes, como fiel da balança nas várias disputas de poder que envolveram alguns dos poderosos países vizinhos, ao longo dos séculos.
Mas ainda hoje parece-nos que o país não faz sentido, tão pequeno e nem uma única língua materna consegue ter, usando o francês, o alemão e um idioma luxemburguês pouco utilizado, como línguas oficiais... e admito que, com a quantidade de portugueses que aqui vivem, a língua portuguesa será também quase uma língua oficial alternativa.
Mas apesar desta falta de personalidade, a verdade é que o Luxemburgo tem hoje, como no passado, uma posição na Europa perfeitamente definida, com um papel ativo nos processos da governação europeia.
E é um país que permite um bom nível de qualidade de vida, embora a grande quantidade de emigrantes portugueses que lá vivem, e são muitos, privilegiem sobretudo o acumular das poupanças e não tanto a qualidade de vida no dia-a-dia. Mas há indicadores interessantes, como o salário mínimo de 1.900 €/mês (em 2015), que é o mais elevado de toda a Europa. O custo de vida é caro, sobretudo nos restaurantes, não tanto em supermercados, mas não mais que nas vizinhas Bélgica, França ou Alemanha… mas também não parece que a comunidade portuguesa frequente assim tanto restaurantes e hotéis, ou lojas de roupa, por exemplo… por isso deve dar para amealhar um bom dinheiro.
Como polo turístico a cidade do Luxemburgo não é particularmente interessante. Não é, contudo, apenas mais uma cidade do centro da Europa. Esta tem um formato diferente do habitual por se localizar em torno de um vale cavado, que é ligado por várias pontes que nos permitem contemplar os dois lados da cidade, que ocupam as encostas do vale, e também a parte mais baixa, que ocupa o próprio vale ao longo do rio.
Fizemos um percurso que nos levou ao longo da zona histórica da cidade que, apesar de não ter sido muito extenso, foi penoso, devido aos 30 e muitos graus com que a cidade nos aguardava. O caminho que fizemos, pelo qual nos arrastámos, seguiu aproximadamente os trilhos marcados neste mapa:
Começámos a nossa caminhada pelo Sul da cidade, onde ficava o nosso hotel, mais ou menos na proximidade da gare ferroviária, apesar de termos vindo de carro e não de comboio.
No primeiro percurso entrámos na Avenue de la Liberte, uma avenida a fazer lembrar os boulevards parisienses, até à Place des Martyrs, uma praça monumental ajardinada,

Mais à frente, chegaríamos à Bourbon-Platte. O termo “Platte” significa plataforma ou planalto, referindo-se à parte elevada dessa zona, que fica o início da Pont Adolphe. Trata-se de uma área urbanizada com importância histórica e administrativa, onde têm sido desenvolvidos projetos de requalificação urbana para melhorar o espaço público e a mobilidade pedonal, mantendo a arquitetura clássica de alguns belos edifícios.
De seguida fizemos a travessia da Pont Adolphe ou Adolphe-Brücke. Construída entre 1900 e 1903 em homenagem ao Grão-Duque Adolphe, é uma ponte de arco em pedra sobre o vale Pétrusse, com cerca de 153 metros de comprimento e 42 metros de altura. É um símbolo nacional da independência, foi na época uma das maiores pontes em arco do mundo. Atualmente, além de servir o trânsito automóvel e uma linha de tram, é muito utilizada por peões e ciclistas.

Do lado Norte da ponte fizemos um pequeno desvio no Parc Edith Klein, onde resolvemos parar para refrescar um pouco, neste dia tão surpreendentemente quente. É um pequeno e tranquilo espaço verde, situado já muito perto do centro da cidade, com jardins bem cuidados, caminhos pedonais e áreas de lazer, ideal para passeios curtos ou, neste caso, para uns momentos de descanso.
Voltando ao caminho, parámos de seguida numa das praças mais diferenciadas da cidade do Luxemburgo, a Place de la Constitution. Esta praça ocupa uma saliência que se forma nas muralhas, localizada sobre o vale da Pétrusse, e é sobretudo um miradouro que permite contemplar a bonita vista sobre este vale, entre as pontes Adolphe e Passerelle.
Além das paisagens sobre o vale, esta praça oferece também as belíssimas imagens do jardim que fica num patamar ligeiramente inferior à praça, uma espécie de jardim francês bem cuidado.
No centro da praça ergue-se ainda o monumento Gëlle Fra, que homenageia os soldados luxemburgueses mortos na Primeira Guerra Mundial. Uma estátua sobre um obelisco que foi inaugurada em 1923, e representa uma mulher dourada erguendo uma coroa de louros, símbolo da vitória e da liberdade. Destruída pelos nazis durante a Segunda Guerra Mundial e restaurada em 1984, a Gëlle Fra é hoje um dos principais símbolos nacionais do Luxemburgo, representando a paz, a resistência e a independência do país.

O destino seguinte foi o Palais de Justice de Luxembourg, localizado no Plateau du Saint-Esprit, formando um complexo que concentra as principais instituições do sistema judicial luxemburguês. Não deve ser confundido com o Tribunal de Justiça da União Europeia, que fica situado no bairro de Kirchberg.
Logo de seguida chegamos de novo ao vale sobre o rio Pétrusse que, nesta zona, é atravessado pela Ponte Passerelle. Trata-se de um viaduto construído entre 1859 e 1861 para ligar o centro da cidade à nova estação ferroviária do Luxemburgo, que foi localizada na margem Sul do vale Pétrusse. É feita em alvenaria, com 24 arcos, e tem 290 m de comprimento e uma altura de 45 m. É também conhecida como a ponte velha, sendo que a nova ponte, nessa comparação, será a ponte Adolphe.
Do lado Norte do vale, no centro histórico da cidade, visitámos a Catedral de Notre-Dame. É a igreja mais importante do país e a catedral da Arquidiocese do Luxemburgo. Trata-se de um edifício gótico construído pelos Jesuítas no séc. XVII. O edifício destaca-se pelas suas torres esguias, vitrais coloridos e pela cripta onde se encontram os túmulos dos grão-duques do Luxemburgo.
O seu portão principal, tem uma estátua da Virgem e está também adornado pelas estátuas dos apóstolos Pedro e Paulo, e pelos jesuítas Inácio de Loyola e Francisco Xavier, e ainda uma estátua de São Nicolau a completar o conjunto.
Muito próximo da Catedral entramos na Place Guillaume II, que marca o coração do centro histórico da cidade, no bairro Ville Haute. A praça é dominada pelo edifício da Câmara Municipal e pela estátua equestre do antigo Grão-Duque Guilherme II, que dá o nome à praça.
Fizemos a próxima paragem na Place d'Armes, uma das praças mais emblemáticas e animadas desta cidade. Está rodeada por edifícios históricos, onde se destaca o Stadt Palais, antiga residência da família real e um exemplo notável da arquitetura clássica luxemburguesa.
Atualmente, a praça é um ponto de encontro popular, cheia de restaurantes, cafés e esplanadas, que criam um ambiente agradável e acolhedor. Frequentemente recebe também alguns concertos, feiras e eventos culturais, sendo um dos principais espaços de convívio e lazer da capital. Mais à noite iríamos voltar a esta praça para ali jantarmos.
Percorremos agora as ruas comerciais mais movimentadas do centro, como a Grand-Rue e a Rue du Cure, e passámos também pela Place du Théâtre, onde se encontra a Cinemateca Municipal e, em pleno centro da praça, um conjunto de estátuas que é chamado de Saltimbanques, com esculturas de um cuspidor de fogo, um palhaço e toda uma trupe de artistas, que celebram o lado criativo da cidade.


Mais à frente, chegámos ao Palais Grand-Ducal, o palácio da residência oficial do Grão-Duque do Luxemburgo para o exercício das suas funções como Chefe de Estado e o principal símbolo da monarquia luxemburguesa. Foi construído no século XVI em estilo renascentista flamengo, e serviu inicialmente como sede do governo municipal, antes de se tornar, já no século XIX, no palácio oficial do soberano. Com uma fachada elegante e varandas ornamentadas, o palácio combina uma rica história e tradição com as funções atuais das institucionais modernas, acolhendo cerimónias oficiais e receções de Estado.
Durante a ocupação alemã, na Segunda Guerra Mundial, o Palácio Grão-Ducal foi usado pelos nazis como estalagem e salão de concertos. Nesse período, várias mobílias e obras de arte foram destruídas ou pilhadas. Com o fim da guerra, em 1945, e com o regresso da grã-duquesa Charlotte, o palácio voltou a ser a sede da corte. Entretanto, durante a década de 1960, e ainda sob a supervisão de Charlotte, o palácio foi totalmente redecorado. Desde então, o seu interior, que não se encontra regularmente aberto ao público, voltou a ser renovado para ficar compatível com os padrões modernos de conforto.

Vamos agora aproximando-nos de novo das muralhas da cidade, onde podemos apreciar as bonitas paisagens que esta cidade vai mostrando. A disposição da cidade do Luxemburgo é muito sui generis, distribuída entre os patamares superiores das colinas que formam o vale Pétrusse, a chamada Ville Haute, e o próprio fundo do vale, conhecido por Grund. Estes desníveis permitem que possamos observar algumas bonitas paisagens da cidade, tanto das encostas como do próprio vale, com as suas pontes e as suas construções.
Nesta zona, junto às muralhas, e também da Pont du Château, vamos encontrar vários miradouros que permitem desfrutar das paisagens da cidade, como neste caso do belíssimo conjunto urbano que integra a Église Saint-Michel.

Nestes mesmos pontos da fortaleza podem contemplar-se outras paisagens da cidade, com destaque para a vista sobre o Grund, um bairro que foi considerado património da humanidade e que fica lá em baixo, no fundo do vale. É um bairro típico e muito calmo, que se desenvolve ao longo das margens do rio Pétrusse, e onde se salienta a Neumünster Abbey.
Nestas fortalezas existem alguns pontos notáveis, como as Três Torres ou as Casemates du Bock.
As Três Torres são os vestígios de uma antiga fortificação medieval situada na cidade, junto ao bairro de Clausen. Construídas entre os séculos XIII e XV, faziam parte do extenso sistema defensivo que protegia a cidade, conhecida como a “Gibraltar do Norte” devido à sua impressionante estrutura militar. As torres, feitas em pedra e de formato cilíndrico, integravam muralhas, ameias e aberturas para arqueiros, refletindo a importância estratégica do local naquela época. Hoje, as Três Torres são um monumento histórico preservado e um dos marcos mais antigos do património fortificado do Luxemburgo, testemunhando o passado militar da cidade.
As Casemates du Bock foram as antigas muralhas da cidade de Luxemburgo, na época da sua fundação, por volta do ano 1000 e que, em 1994, foram declaradas pela UNESCO como património da humanidade.
Atualmente estão abertas ao público durante a Primavera e o Verão. A visita a este lugar pode ser interessante, embora não seja recomendável para claustrofóbicos, pois está cheia de passagens e cavernas ocultas... mas também alguns pequenos miradouros por entre os túneis e as cavernas que se vão encontrando.
Daqui é também visível o imenso Viaduc Ferroviaire, uma das estruturas mais emblemáticas da cidade do Luxemburgo. Construído entre 1859 e 1861, durante a expansão da rede ferroviária do país, o viaduto liga o centro histórico à estação central, atravessando o vale de Pétrusse. Projetado por engenheiros britânicos, o viaduto desempenhou um papel crucial no desenvolvimento urbano e económico do Luxemburgo e continua hoje a ser uma importante via ferroviária e um marco arquitetónico da cidade.
Antes de terminarmos o dia passámos de novo pela Place d'Armes, onde jantámos numa das esplanadas. Estava uma grande animação com o som da música que saía de um palco, onde decorria uma festa popular, a fazer lembrar as festas de Verão das nossas aldeias... seria só coincidência ou haveria dedo de portugueses por detrás daquele evento - acredito bem que sim.
Deixámos uma cidade que surge por entre vales verdes e muralhas seculares, e que é também um país que se revela, não apenas como um destino, mas como uma sensação - a de um lugar onde o tempo desacelera e a história sussurra a cada esquina. As ruas de pedra, os cafés tranquilos e os sons suaves de uma mistura de línguas criam uma melodia especial, discreta e acolhedora. No coração da Europa, o Luxemburgo ensina que a grandiosidade nem sempre se mede em tamanho, mas na forma de como um lugar nos faz sentir parte de algo maior, mesmo que por um breve instante... e foi desta forma que conhecemos uma nova cidade e também um novo país.

