domingo, 4 de novembro de 2007

Baviera


Em duas das ocasiões em que estive em Munique, resolvi alugar um carro e seguir à descoberta da zona Sul da Alemanha, ocupada pela região da Baviera, e integrada no antigo Tirol, que constitui atualmente, um excelente local para um passeio de um dia completo, passando pelos belíssimos vales, grande parte do ano cobertos por uma vegetação muito verde, e com os picos das montanhas caiadas do branco da neve.

Nesta zona encontramos também os castelos de rei Ludwig II, o Rei Louco da Baviera, que aproveitamos para visitar.

Assim, e para esticar o dia, temos que sair bem cedo de Munique em direção ao Sul, para chegarmos à região dos Alpes do Tirol, e podermos visitar com tempo esta zona magnífica, cheia de montanhas e lagos, e adornada pelos mais belos castelos que possamos imaginar. 

Para este dia, sugiro o trajeto que segui na última viagem que ali fiz, no ano de 2007, em que passámos pelos trilhos assinalados neste mapa:

O nosso programa levou-nos até à zona do Tirol e passar pelo Castelo de Neuschwanstein, o mais bonito e mais emblemático dos castelos de Ludwig II, o Rei “Louco” da Baviera.


Oberammergau

Mas a viagem prevista levava-nos, em primeiro lugar, a Oberammergau, uma pequena cidade que é conhecida pelas suas casas com as fachadas adornadas com frescos de diversos motivos, como a casa onde figura a representação da história do Capuchinho Vermelho, um clássico dos irmãos Grimm.

É bem interessante percorrer as ruas desta pequena cidade como quem visita uma galeria de arte, em que as obras-primas se vão sucedendo a cada esquina.
Além das casas decoradas, nesta zona do Sul da Alemanha encontram-se também alguns dos principais palácios da Baviera. Aliás, há mesmo quem faça um percurso seguindo à risca o circuito assinalado entre palácios e castelos. Mas não foi essa a nossa escolha, o nosso destino era percorrermos as montanhas e vales daquela região, e usufruirmos da beleza das paisagens, mas, pelo caminho, fomo-nos cruzando com algumas dessas construções imponentes e luxuosas.
Já fora da cidade de Oberammergau atravessámos a Baviera mais profunda e campestre, com sinais das explorações agrícolas e pecuárias, numa paisagem rural de grande beleza. Num dia de sol, como este, as imagens revelam bem o contraste entre os verdes vivos dos campos e a folhagem das árvores, com os castanhos e vermelhos outonais.

A existência de lagos é muito comum nesta zona, com  as suas paisagens magníficas do espelho de água  refletindo a beleza sublime das imagens que se avistam, sobretudo em dias de céu limpo e sem vento, como era o caso deste dia frio de novembro.



Castelo de Neuschwanstein

Cerca de 50 km depois estávamos a chegar ao pequeno vilarejo de Hohenschwangau, localizado no sopé da colina do Castelo de Neuschwanstein, um local não é mais do que um polo de apoio aos muitos turistas que visitam os castelos que se erguem nas montanhas vizinhas.
É necessário deixar o carro num dos parques que são disponibilizados na vila e, daí, existem diferentes formas de chegar até ao castelo. Podemos apanhar um Shuttle Bus, por um preço de 2,6€ para os dois trajetos, ou uma requintada charrete, mas aí por 6€ a subida e 3€ a descida. Mas nós, que gostamos sempre do que é mais difícil, decidimos fazer os quase 2 km da subida e da posterior descida, sempre a pé. Mas não há dúvida que é desta forma que conseguimos ter a perceção dos espaços envolventes e sentimos o ambiente natural que nos rodeia de forma mais genuína. 
Caminhámos por entre florestas densas e esplendorosas, passando pela Ponte Marienbrücke, de onde se consegue o melhor local para observar o castelo (e que as outras alternativas de transporte não proporcionam).
Mas o que mais nos deslumbrou em toda a caminhada foi o instante em que, depois de contornar a colina no acesso à ponte encaixada nas encostas do desfiladeiro, se abriu à nossa frente a imagem de um vale inacreditável, dominado pela imponência e pela beleza do castelo… e foi como se, de repente, um cenário encantado nos tivesse engolido e as imagens de um mundo de fantasia, de príncipes e princesas, nos envolvessem agora num ambiente de sonho. Não foi em vão que Walt Disney escolheu este castelo como inspiração e modelo para criar o palácio que recebeu o grande baile, na noite de magia, que viria a transformar a Gata Borralheira na princesa Cinderela.
Por muitas maravilhas que o interior do castelo nos possa oferecer, com divisões luxuosamente mobiladas, com tetos e paredes debruados a ouro e outras preciosidades, nada se compara com a sensação de ser envolvido por aquela paisagem magnífica.

Estávamos ainda trémulos, do cansaço da subida, mas sobretudo da surpresa vivida por aquelas imagens que nos surgiram de repente e sem aviso. Parámos sobre a ponte e tentámos descortinar cada detalhe daquele postal ilustrado onde tínhamos acabado de entrar. E só então começámos a sentir verdadeiramente o prazer daquele momento tão sublime, já percebendo que aquilo era mesmo real. Inspirámos o ar fresco a plenos pulmões e deixámo-nos ficar o tempo suficiente para deixar as emoções sossegarem… com a certeza de que aqueles momentos ficariam definitivamente gravados nas nossas memórias e eternizados no nosso mundo dos sonhos.

Acabámos por cumprir o trajeto final e chegar até ao castelo, mas sabíamos que isso já não seria o mais importante desta visita.
O Castelo de Neuschwanstein é o mais bonito e mais importante dos três castelos do rei Louco. Ludwig II, que governou a Baviera no final do século XIX, era um romântico e um sonhador, e mandou construir, durante seu reinado, vários castelos e palácios extravagantes, gastando o dinheiro do reino de forma obstinada e quase louca. Desde então, começou a ser conhecido popularmente como Rei Louco. Mas foi o seu próprio governo, aproveitando esse mito popular, e receando as dívidas que não paravam de aumentar, que lhe diagnosticou com uma doença mental, declarando-o oficialmente como louco, tendo sido deposto e preso, exatamente um dia antes de sua morte. Graças à loucura, ou extravagância, deste governante, ficaram três castelos dos mais maravilhosos que se podem encontrar em toda a Alemanha.

Este é, dos três castelos, o mais imponente e o mais bonito. Foi construído no final do século XIX, e tem um interior luxuosíssimo. Foi equipado com toda a tecnologia de que à época se dispunha, como uma rede de água corrente, quente e fria, que abastecia as casas de banho do castelo, bem como o sistema de aquecimento, altamente revolucionário naquela altura, mas bastante necessário, durante os Invernos numa zona sujeita a constantes nevões.

O castelo de Neuschwanstein é visitável por um preço de 12€ por adulto e é gratuito para as crianças com menos de 18 anos (preços de 2007). Atenção que é proibido tirar fotos no interior do castelo.

No percurso de descida voltámos a encarar o castelo dos sonhos e voltámos a contemplá-lo demoradamente, até sentirmos que já estaríamos prontos para a derradeira despedida.


Castelo de Hohenschwangau

Do alto destas colinas podemos ainda avistar os lagos que rodeiam a vila de Hohenschwangau e o castelo com o mesmo nome, numa paisagem, também ela de uma beleza sublime, com os tons outonais da folhagem das árvores, contrastando com os verdes dos campos relvados e o azul do espelho de água dos lagos.
Cá em baixo, junto à vila, percorremos ainda as margens do lago, dominado pela presença do castelo de Hohenschwangau. A caminhada foi tranquila, servindo sobretudo para nos acalmar das emoções vividas naquelas últimas horas.

Depois de uma viagem como esta só posso dizer que recomendo vivamente uma visita a esta zona o Sul da Alemanha, sobretudo pelo momento em que a paisagem se abriu à nossa frente e nos fez mergulhar num autêntico cenário de um conto de fadas. Mas registo que é indispensável que as condições de visibilidade ajudem, caso contrário, num dia nublado ou chuvoso, o interesse deste local perde-se. 


Füssen

Seguimos depois para Füssen, já na fronteira com a Áustria, uma aldeia típica, rodeada de lagos e montanhas pintadas de neve. O dia estava ainda bastante bonito, e o ambiente estava muito agradável, e aproveitámos para almoçar numa esplanada soalheira, com as habituais salsichas e as, também habituais, weiss beers.



Alpes Tiroleses

Entrando pela Áustria, no coração dos Alpes do Tirol, optámos pelas estradas secundárias, por entre vales ladeados por montanhas nevadas. O objetivo não era chegar a sítio nenhum mas apenas deambular por aquelas paisagens que nos iam aparecendo pela frente, parando sempre que nos apetecesse.

Foi assim que fomos brindados pela silhueta desta magnífica cordilheira, que integra o Monte Zugspitze, o pico mais alto da Alemanha, com 2.962 metros de altitude, localizado nos Alpes Bávaros, na fronteira com a Áustria.

As aldeias que vamos encontrando são geralmente muito típicas e recordam-nos as caixas de chocolates suíços, mesmo sem estarmos na Suíça, com as suas igrejas e as montanhas lá atrás, com os picos cobertos de neve e, no vale, aqueles campos relvados que lembram um imenso tapete com um verde sempre viçoso.



Grainau

Voltámos a entrar na Alemanha e chegámos a Grainau, uma zona de lagos com montanhas nevadas, de onde sai um teleférico que distribui os skiadores pelas várias estâncias que ficam para lá daquelas colinas.

Quisemos aproveitar o ambiente bucólico do final de tarde numa esplanada junto às águas serenas de um lago rodeado de montanhas e resolvemos pedir um chá que nos aquecesse do ar que nos começava a gelar… e por lá ficámos, apreciando aquele entardecer. 

E aí aconteceu um episódio curioso… as viagens também se fazem de surpresas e não apenas do que imaginamos encontrar. Neste caso, uma equipa de filmagens de uma qualquer televisão alemã preparava-se para rodar um anúncio sobre vida saudável… não era com marcas mas apenas com este conceito. Nas imagens iria aparecer o plano de uma modelo a trincar com vigor uma maçã estaladiça, enquadrada na paisagem do lago como fundo. Acontece que a modelo, uma alemã típica, loira e alta, tinha uma marca de herpes no lábio inferior, que não estavam a conseguir disfarçar com maquilhagem. E aí pediram à Ana para que ela se deixasse filmar a morder a maçã, substituindo a modelo mal retocada. 

E assim foi, repetiu a cena duas vezes e a equipa de filmagens ficou contente com o resultado. Informaram-nos que o anúncio iria passar pelas televisões alemãs onde, estranhamente, em vez duma loira deslavada, apareceu uma morena bonita... e ainda nos ofereceram os adereços sobrantes, neste caso, duas maçãs, cada uma com a sua dentada. 

Voltámos, entretanto, ao nosso chá apreciando a nostalgia do entardecer nas margens daquele lago calmo no coração dos Alpes do Tirol.



Garmisch-Partenkirchen

No caminho de volta até Munique, haveríamos ainda de parar ainda em Garmisch-Partenkirchen, a maior das cidades daquele local e o centro de um conjunto de estâncias de ski, onde acontecem correntemente campeonatos e taças do mundo em ski alpino... e até já lá foram realizados os Jogos Olímpicos de Inverno, mas há muito tempo e numa época terrível para a Alemanha, em 1936.

No final deste dia tão rico, e com as luzes já difusas do entardecer, Garmisch já não nos acrescenta quase nada, apenas uma maior oferta de restaurantes e lojas de souvenires. Mas numa viagem que fiz anteriormente àquela zona da Alemanha, esta tinha sido justamente a cidade que mais me tinha encantado. As coisas mudam muito, o clima também condiciona bastante e, certamente, nós próprios vamos também mudando.

E repito que é preciso termos sorte com o tempo, pois faz toda a diferença se tivermos um dia de sol ou um dia completamente nublado, aliás, já vivi já essa mesma experiência quando, em 1994, tentei visitar este local num dia de chuva intensa… e foi como se nem sequer cá tivesse estado. 

Mas no conjunto, este foi um dia formidável, daqueles que guardamos na galeria dos melhores dias das nossas vidas... 


Carlos Prestes
Novembro de 2007