sábado, 7 de junho de 2025

Costa de Bari


Passámos um dia completo ao longo da costa do Adriático localizada a Sul de Bari, um pedaço de litoral que revela uma beleza serena, onde o branco das casas e o azul do mar parecem fundir-se num mesmo horizonte. Ao sairmos da cidade de Bari, a estrada costeira conduz-nos a Polignano a Mare, suspensa sobre falésias de calcário que mergulham no mar transparente. As varandas das casas antigas abrem-se sobre o abismo ao som das ondas que ecoam nas grutas escondidas sob a vila. É um lugar de poesia e vertigem, onde a brisa nos traz o cheiro do sal e o murmúrio das histórias que o tempo guardou nas rochas.

Neste primeiro dia seguimos pelo percurso marcado neste mapa, começando em Polignano e terminando, já à noite, na típica vila de Alberobelo. Fazendo zoom no mapa, em cada um dos locais visitados, vamos encontrar, em detalhe, os vários pontos de interesse, que ali estão assinalados.
 



Polignano a Mare

Polignano é a cidade mais encantadora desta zona costeira, famosa pelas suas espetaculares falésias calcárias e pela icónica praia de Lama Monachile. É um destino popular que oferece uma mistura de beleza natural, com uma história rica, e onde está sempre presente o charme tipicamente italiano.

Chegando à cidade depois de percorrermos 35 km desde Bari, procurámos um parcheggio onde iríamos deixar o carro durante grande parte do dia.

Ao chegarmos junto ao mar, entrando pelo lado Norte, começamos por encontrar a Estátua de Domenico Modugno, numa homenagem que a cidade presta ao seu filho mais famoso, o cantor e compositor da icónica canção "Volare".
Mas junto a este monumento, que fica numa praça ampla à beira-mar, encontramos também um dos principais pontos de observação da cidade.
Basta descer uma escadaria que liga a praça à falésia que forma a baía da praia de Lama Monachile, e podemos contemplar a belíssima paisagem de águas azul-turquesa e com os edifícios pitorescos encavalitados sobre a encosta.

Contornando depois a baía, chegamos à Ponte Borbonico que cruza o vale onde se forma a famosa Praia de Lama Monachile. Encaixada entre duas falésias rochosas, esta pitoresca praia de seixos é um dos locais mais fotografados da cidade.
Apesar do extraordinário aspeto desta praia, quando a observamos do alto da Ponte Borbonico, a verdade é aquele “areal” de cor esbranquiçada, não tem areia nenhuma, mas apenas calhau, que é muito pouco confortável para os banhistas que ali descansam ou se tentam movimentar.

Assim, para quem estiver mortinho por um mergulho, em primeiro lugar deve estar preparado com aquelas sapatilhas para se andar sobre as rochas, e depois, em vez de ficar esticado a apanhar banhos de sol, deve entrar logo na água e ficar por lá a nadar nas águas calmas da baía… mas atenção, que a água não é assim tão quente, não vai além dos 21, 22 graus.
Depois de algum tempo na praia - que eu não recomendo particularmente, pois sugiro que se faça um passeio de barco, no qual é feita uma paragem para uns mergulhos, o que é bem mais agradável do que entrar nesta praia - seguimos então para o centro histórico.

Trata-se de uma zona muralhada, repleta de ruas estreitas e sinuosas, casas caiadas e varandas floridas, num extraordinário labirinto para se explorar a pé, passando, de vez em quando, por algumas praças maiores, como a Piazza Vittorio Emanuele II, com a sua Chiesa Madre di Santa Maria Assunta, uma das mais importantes igrejas locais.
    

Uma curiosidade deste centro histórico, embora não seja algo que encontremos com muita frequência, é a existência de algumas paredes, escadarias ou portas, que exibem trechos de poesia escritos em italiano por poetas conceituados, ou por algum morador local. É uma ideia engraçada que se transformou numa atração, e é sempre uma bela surpresa, irmos encontrando estes pedaços de poesia espalhados pela cidade.
        

No final de cada uma destas ruas do centro, acabamos sempre numa varanda, num terraço ou num miradouro… os balcones, terrazzas e belvederes, que nos proporcionam algumas belas paisagens sobre as falésias e as casas que ali se penduram.

Destaco dois desses terraços, que ficam mais próximos da baía da Praia de Lama Monachile, o Belvedere Terrazza Santo Stefano e o Belvedere su Lama Monachile, que oferecem bonitas vistas sobre o mar Adriático e sobre as falésias.

É exatamente nestas varandas que são montadas, uma vez por ano, as plataformas de saltos para a realização da competição mundial de saltos de penhascos, a Red Bull Cliff Diving. Neste caso, realizou-se apenas algumas semanas depois da nossa visita, e acreditem que é um evento fantástico, conforme pudemos assistir há dois anos, na cidade bósnia de Mostar. Desta vez, ficou apenas a referência dos balcones a utilizar pelos mergulhadores para aqueles saltos extraordinários.

Continuando no centro histórico vamos encontrando novas ruas e becos, mas sobretudo, novas varandas onde é possível apreciar o carrossel de casas pitorescas empoleiradas nas falésias de calcário.
Se quisermos almoçar pelo centro histórico podemos escolher um dos muitos restaurantes que por ali se encontram, mas nem vale a pena tentar o mais famoso de todos, o Grotta Palazzese, um restaurante muito especial que só é acessível com reserva com muita antecedência e é demasiado caro e luxuoso para um simples almoço… não estávamos sequer com um outfit adequado a tanto requinte, nem disponíveis para uma conta tão pesada. Assim, limitámo-nos a espreitar o restaurante, que se vê do Mirador Blue, e que é uma referência da cidade e famoso internacionalmente, por estar localizado dentro de uma gruta que parece ter sido engolida pelo mar.

Mas mais tarde haveríamos de passar de barco muito próximo desta gruta, e apreciar o lugar e também os sortudos que ali desfrutavam da sua refeição naquele lugar tão especial.

Uma outra atração de Polignano são os passeios de barco. Estas excursões são oferecidas na rua, custam entre 30 e 40€, com direito a cerca de duas horas de passeio, uns snacks e um copo de espumante. Vêm buscar-nos à cidade e levam-nos de carrinha até à praia de San Vito, de onde saem os barcos, normalmente uns semi-rígidos.

Durante o passeio vamos explorando as cavernas marítimas e as formações rochosas ao longo de toda a costa, que é dominada pelas suas construções que, dali de baixo, parecem estar em permanente risco de colapso.

Quando termina a cidade continuamos para Sul, até já perto de Monopoli, sempre apreciando as várias grutas que ali existem… mas que, na nossa opinião, não têm um interesse particular, sobretudo quando comparamos com as visitas às caves algravias, a que estamos habituados.

No final, antes de fazer o percurso de regresso, o barco pára numa baía e nós podemos saltar para dentro de água, e por ali ficar cerca de meia hora. No regresso ao barco somos presenteados com os snacks e um copo de bollini, o espumante italiano.

Não foi o melhor mergulho do mundo, até porque a temperatura da água não era assim tão fantástica, como já comentei, mas terminámos a visita a esta cidade bastante felizes... estava a ser um grande dia.

De Polignano não trazemos apenas imagens, mas o eco suave do Adriático e a calma que parece permanecer connosco, como se o mar nos continuasse a embalar muito depois da partida.



Praias de Monopoli

Antes de chegarmos ao nosso próximo destino, que seria em Monopoli, fizemos um pequeno desvio para Sul, para tentarmos encontrar uma praia onde iríamos ficar um pouco, para uns banhos de mar e de sol.

Esta costa é recortada por falésias e grutas, com alguns espaços de acesso ao mar, que não são bem o nosso tipo de praias, pois têm um areal muito escasso e com muita pedra misturada na areia… o que obriga a um dos acessórios indispensáveis para esta viagem, as sapatilhas de borracha para acesso às praias.

Encontram-se na zona de Monopoli algumas praias que são características desta costa de falésias rochosas. É o caso da Grotta della Cala Tre Buchi, com uma praia que nada tem a ver com os nossos areais, embora com águas azuis-turquesa muito tentadoras. Estas três cavernas naturais, que o nome indica, são, na verdade, apenas três aberturas de uma única gruta costeira.

Enquanto conjunto rochoso junto ao mar, podemos apreciar a beleza da paisagem, mas como praias não têm particular interesse e, por isso, nem quisemos descer.

Voltando de novo ao carro parámos um pouco mais abaixo junto à praia de Porto Ghiacciolo. Esta praia tem um pequeno areal junto à bonita Abadia de Santo Stefano, combinando uma beleza natural sublime, com um toque medieval… apenas perturbada pela presença de imensos banhistas, sobretudo de italianos, não tanto de turistas estrangeiros.

A praia de Porto Ghiacciolo é uma enseada abrigada, de água azul cristalina, que reflete o branco da areia e o dourado suave das falésias. O cenário é dominado pela presença imponente da Abadia, erguida sobre o penhasco, como uma sentinela antiga que guarda os segredos deste lugar.

Mas é também marcado pelo espelho de água que ali se forma, protegido pela enseada, e que nos permite nadar à vontade até bem longe, deixando para trás a multidão que ocupa o areal e a zona da praia perto da margem.


Quanto à Abadia de Santo Stefano, foi construída entre os séculos XI e XII, e foi, durante séculos, um ponto estratégico e espiritual na costa adriática. O seu aspeto austero, quase monástico, contrasta com a leveza do mar que a rodeia e, vista da praia, a Abadia completa o cenário, num diálogo entre o mar e aquele rochedo, entre o presente e a eternidade.



Monopoli

Estávamos a apenas 10 minutos de carro da cidade de Monopoli, onde iriamos passar o final da tarde. Este encantador vilarejo costeiro localizado na Puglia, a cerca de 10 km de Polignano a Mare, tem um centro histórico muito interessante, formado por um labirinto de ruelas medievais, praças charmosas e casas caiadas de branco, com semelhança ao estereótipo das aldeias gregas.
Entrámos pelo centro histórico, formado por uma malha de ruas brancas à beira-mar, onde o tempo parece ter recuado até à idade-média. Entre muralhas antigas e o brilho do Adriático, revelam-se igrejas barrocas, praças escondidas e o cheiro do mar que se mistura com o aroma que vem das trattorias. Caminhar pelo centro é descobrir um bocadinho da alma mediterrânica de Monopoli, uma cidade bastante interessante, vibrante e cheia de história.
    

As ruelas do centro acabam sempre por convergir para a principal praça desta zona da cidade velha, a Piazza Giuseppe Garibaldi. Uma praça com o pavimento em lajes de pedra calcária, é rodeada por edifícios baixos com tons quentes, alguns deles com esplanadas de bares e restaurantes, onde os turistas descansam, enquanto observam o vaivém dos moradores e viajantes, que dá vida a esta cidade.
Pouco depois chegamos ao Porto Antigo, o Porto Vecchio, pitoresco e ainda muito ativo, onde os barcos de pesca coloridos atracam no cais, em frente aos cafés e restaurantes que dão vida a esta zona da cidade velha.

O Porto Vecchio é uma joia à beira-mar, um refúgio onde o azul do Adriático encontra as muralhas antigas e os barcos de madeira pintados de azul vibrante, conhecidos como gozzi, que contribuem para um ambiente tranquilo e profundamente mediterrânico, enquanto o som das ondas se mistura com o das gaivotas e com a vida quotidiana dos pescadores.

Seguindo pela beira-mar encontramos o Castello Carlo V, que domina a paisagem marítima da cidade, com a sua presença sólida e majestosa, e entramos depois num passeio marítimo que acompanha a muralha do centro histórico, e que é chamado de Lungomare Santa Maria. O percurso, ladeado por edifícios antigos e pequenas enseadas, é uma área pedonal muito frequentada, permitindo o contacto direto com o com o património local e com mar, embora nesta zona estejamos dentro da baía do porto comercial.
Ao longo deste passeio encontramos o Bastione Santa Maria, que é uma das antigas fortificações que integravam o sistema defensivo de Monopoli, construído para proteger a cidade de invasões marítimas, onde ainda hoje existem os antigos canhões.

No mesmo passeio, o Lungomare Santa Maria, vamo-nos cruzar com a Chiesa di San Salvatore. Conta-se que um capitão, salvo de um naufrágio ao largo de Monopoli, mandou construir uma capela em honra de São Salvador, e foi assim que nasceu esta igreja, que é uma das mais antigas da cidade.

Saindo deste passeio marginal voltamos a entrar no labirinto das ruas do centro histórico, sempre marcado pelas casas brancas e as ruas empedradas, no mesmo estilo, quase grego, que marca a cidade velha.

Sempre que se forma um pequeno largo, surgem esplanadas onde podemos aproveitar o calor suave e acolhedor do fim da tarde, sob o aroma a sal e embalados pelo murmúrio do mar. Já de pés descalços sobre o empedrado morno, pedimos um copo de vinho italiano e alguma especialidade local, que nos acompanha enquanto recuperamos forças após um dia tão intenso e pleno como este.

Numa das maiores praças escondidas no emaranhado de ruas, descobrimos dois dos principais monumentos da cidade, o Palazzo Palmieri e a Chiesa di Santa Teresa. Ambos exibem fachadas em tons de areia, quase se confundindo com as casas mais simples que os rodeiam.

Regressando às ruas marginais, seguimos pela Via Papacenere e, depois, pela Via Argento, de onde já se avista a torre da catedral da cidade.

A Cattedrale Maria Santissima della Madia, construída entre os séculos XII e XVIII, é a principal igreja de Monopoli. A sua fachada é um belo exemplo do estilo barroco, mas é no interior que se revela a sua verdadeira joia.

Monopoli é igualmente conhecida pelas suas praias, embora aquelas que aproveitam as enseadas que se formam em plena cidade, não sejam nada do meu agrado. No entanto há uma praia especial, a Cala Porta Vecchia, não tanto para banhos de mar e de sol, mas, sobretudo, pelo seu enquadramento paisagístico, quando visto a partir da zona marginal do Lungomare Portavecchia, com a cidade velha por trás, marcada pela presença dominante da torre da catedral.

E assim termina a nossa visita a esta bela cidade, um lugar que reflete o brilho do mar e revela a experiência de uma vida autêntica e serena, de que os seus moradores usufruem… e em cada esquina, há sempre uma história por revelar, e a cada pôr do sol, surge um convite para ficar um pouco mais.

Vamos agora percorrer um trajeto de cerca de 30 km, até Alberobello, a aldeia em que as casas têm telhados em forma de cone, os chamados Trulli, onde iremos jantar e visitar na manhã seguinte.


Junho de 2025
Carlos Prestes


sexta-feira, 6 de junho de 2025

Puglia e Basilicata


No Verão de 2025 visitámos a região italiana da Puglia (ou Apúlia, em português), um local onde o tempo abranda e o coração desperta, e um daqueles destinos que nos ensinam a viver devagar, a ouvir o som do vento entre as oliveiras e a seguir o ritmo do mar… e a comida, claro, em Itália temos sempre os sabores e os aromas que nos acompanham, e são também uma parte importante de qualquer viagem.

A região da Puglia está localizada no Sudeste italiano, na zona que forma o “salto da bota” no mapa de Itália. É uma das regiões mais pitorescas e autênticas deste país, conhecida por uma rica herança histórica, uma ótima culinária e algumas bonitas praias.

A história mais recente desta região italiana aparece ligada ao domínio espanhol (séc. XVI-XVIII), em que a região foi integrada ao Reino de Nápoles, sob o domínio da Casa de Aragão e, mais tarde, dos Habsburgos espanhóis, num período de grande exploração e centralização do poder, causando pobreza e provocando muita emigração. No século XVIII, passou ao controle dos Borbons do Reino das Duas Sicílias, até à unificação da Itália em 1861, onde a Puglia foi integrada. Contudo, enfrentou problemas económicos e sociais severos, tal como todo o Sul deste novo país, tornando-se numa das regiões italianas mais pobres, com muitos habitantes a emigraram para as Américas e para o Norte da Itália.

No pós-guerra, houve um grande progresso industrial e turístico e hoje, a Puglia é conhecida pelo seu património cultural, pela produção agrícola (vinho e azeite) e, mais recentemente, tornou-se num polo turístico de importância crescente... e por isso, não se deve aguardar para muito mais tarde, uma viagem a esta região italiana, antes que fique abarrotada de turistas, como acontece praticamente por todo o país.

A história da Puglia é visível através dos seus castelos medievais, cidades barrocas, ruínas romanas, tradições gregas e igrejas bizantinas, numa imensa diversidade cultural e histórica que faz parte da oferta turística que vamos encontrar.

Quanto à gastronomia, em Itália come-se sempre bem, embora em certas zonas não se encontre o tipo de comida típica italiana de que estamos à espera, como acontece, por exemplo, na Sardenha, onde estivemos no ano passado. Aqui acontece o mesmo, não temos a oferta gastronómica que se encontra, por exemplo, na Toscana, mas podemos provar outras alternativas da gastronomia local típica. É o caso dos orecchiette, uma massa em forma de pequenas orelhas, ou os taralli, uns biscoitos salgados em forma de anel. Mas a joia da coroa é a nossa bem conhecida burrata, que foi criada nesta região e que é hoje uma iguaria mundial.

O percurso que fizemos ao longo desta parte do Sul de Itália, seguiu aproximadamente os trilhos marcados neste mapa, que nos levaram, não apenas pela região da Puglia, mas também pela sua vizinha Basilicata, onde fica a cidade de Matera, um dos mais belos locais de toda a viagem:          

Os links seguintes dão acesso às crónicas de viagem de cada uma das zonas visitadas nesta região italiana:


Aldeias e vilas da Puglia

Cidade de Lecce

Sul da costa adriática

Praias do mar Jónico

Matera (Região da Basilicata)

Bari e Giovianazzo

Neste verão o sol parecia mais dourado e o ar, quente e salgado, era intenso e acolhedor, e cada estrada de terra ou de asfalto levava-nos sempre a um novo segredo - uma praia escondida, um campo de trulli ou uma pequena aldeia onde parece que o tempo parou.

Foi assim que explorámos esta belíssima parte de Itália, entre o branco das casas caiadas e o azul profundo do Adriático, a Puglia é um convite permanente à contemplação. As manhãs começam com o aroma do café forte e no ar paira o som distante das cigarras; as tardes são para mergulhos demorados e conversas sem pressa; e as noites são sempre um festival de luz morna, vinho local e uma enorme paixão - pelos lugares, mas também por aqueles de que mais gostamos... em Itália é quase sempre assim e aqui na Puglia é talvez ainda mais especial.


Junho de 2025
Carlos Prestes