sábado, 13 de junho de 2009

New York - Percurso 4 - O Downtown



Íamos passar toda a manhã deste dia na baixa da cidade e começámos por ir diretamente de Metro até ao Brooklyn Bridge Park, com vista para o downtown do outro lado da ponte.
Depois de algum tempo a contemplar as paisagens de Manhattan observadas a partir desta margem do East River, atravessámos a ponte de Brooklyn, uma ponte que é quase um símbolo americano e um dos grandes ícones da cidade. 
Brooklyn Bridge é um dos meus locais favoritos na cidade de Nova Iorque e a sua travessia pedonal, que é obrigatória, é sempre uma experiência emocionante. Trata-se de uma ponte suspensa com 1.834m de comprimento, que liga Brooklyn ao downtown de Manhattan, sobre o East River. Foi inaugurada em 1883, o que a torna como uma das pontes suspensas mais antigas dos Estados Unidos. 

A tecnologia de suspensão dos tabuleiros, utilizando milhares de cabos cruzados, marca bem a imagem singular de uma ponte que nos habituámos a conhecer como uma peça de engenharia rara e preciosa.
Durante o século XIX a ilha de Manhattan cresceu muito com a chegada de imigrantes que vieram tentar a sua sorte nos Estados Unidos. Como o custo de vida em Manhattan era elevado, muitas pessoas optaram por morar na região de Brooklyn, que se desenvolveu extraordinariamente. Nesse período, o único acesso entre os dois locais era feito por barcaças que atravessavam o rio e garantiam o transporte de pessoas e bens. Quando, no Inverno de 1867, o East River congelou, causando prejuízos enormes para a população local, as autoridades de Nova Iorque decidiram iniciar o processo que levou à construção desta ponte.

O facto da ponte ter um pouco menos de 2km de extensão permite que, turistas e nova-iorquinos, possam realizar o trajeto entre as duas margens de forma bastante fácil, caminhando ou de bicicleta, o que faz com que esse passeio se tenha tornado num dos mais populares da cidade, e imprescindível para quem quiser entrar verdadeiramente no espirito de Nova Iorque.

Assim, atualmente, atravessar esta ponte é uma experiência imperdível, pelas vistas incríveis do skyline de Manhattan, mas sobretudo pela sensação que se experimenta, que chega a ser arrepiante e, certamente, inesquecível. 

Como não poderia deixar de ser esta ponte está também ligada à sétima arte, surgindo em vários filmes rodados na cidade. De todas essas aparições da ponte no grande ecrã, saliento uma cena brutal do filme Sophie’s Choise, numa interpretação brilhante do ator Kevin Kline, contracenando com Meryl Streep e Peter MacNicol... e é mesmo uma daquelas cenas que marcam um filme, também ele marcante.


À direita da Brooklyn Bridge fica mais uma ponte suspensa sobre o East River, a Manhattan Bridge, que faz também a ligação de Brooklyn até Manhattan, e neste caso vai desembocar na Canal Street, no China Town. 
É uma ponte de estrutura metálica com um comprimento total de 2.089m que foi aberta ao tráfego no ano de 1909. A técnica de suspensão, inovadora à época, veio a ser utilizada mais tarde na conceção de outras pontes suspensas de referência, como a Oakland Bay Bridge e a Golden Gate Bridge, ambas em San Francisco, e mesmo a nossa Ponte 25 de Abril.

A referência cinematográfica que associo de imediato é a imagem desta ponte no cartaz do filme Once Upon a Time in America, de Sergio Leone, com Robert de Niro, um clássico incontornável dos anos 80.
Já do lado de Manhattan seguimos diretamente até ao City Hall Park e à Foley Square. O conjunto formado por estas duas praças concentra alguns edifícios públicos importantes, como tribunais, edifícios municipais, incluindo a Câmara Municipal, e destaca-se ainda, entre outros edifícios imponentes, um dos arranha-céus mais bonitos da cidade. 

Começando pelo New York County Supreme Court, na Foley Square, o Supremo Tribunal do Estado de Nova Iorque que é o tribunal de primeira instância do Estado. Trata-se de um edifício do início do século XX com grande riqueza arquitetónica, e com uma bonita fachada com 10 colunas no estilo clássico romano, que era muito popular na arquitetura dos tribunais nessa época.
Logo ao lado fica o Thurgood Marshall United States Courthouse, o tribunal americano Thurgood Marshall. 

O edifício tem duas partes principais, uma base e uma torre com um total de 180m de altura e 37 andares. A base do tribunal é também bastante particular pela sua fachada com colunas romanas.
Bem próximo deste tribunal mas já no City Hall Park, um jardim conhecido pela sua fonte, a Jacob Mould Fountain, fica o The David N. Dinkins Manhattan Municipal Building, um edifício Municipal construído em 1914, com um total de 40 andares e onde trabalham atualmente cerca de 2 mil funcionários públicos. 

O prédio, que foi o primeiro a incorporar uma estação de Metro na sua base, a estação Chambers Street, tem uma série de influências clássicas da arquitetura, nomeadamente do Romano, do Renascimento italiano e do Beaux-Arts. 

Apesar de ter uma altura 180m, o que, nesta cidade, parece ser razoavelmente baixo, acaba por ser um dos edifícios governamentais mais altos de todo o mundo.
De novo em pleno City Hall Park fica o edifício clássico e monumental do New York City Hall, a Câmara Municipal de Nova Iorque, que funciona como sede do conselho municipal e como escritório do Presidente da Câmara, o Mayor da cidade. O edifício foi construído em 1811 e é mesmo a sede municipal mais antiga dos Estados Unidos que ainda se encontra em plena utilização. 
Ainda neste mesmo parque, no número 233 da Broadway Avenue, que começa aqui bem perto, fica o Woolworth Building, um arranha-céus de 57 andares e 241m de altura, que na época da sua inauguração, em 1913, era um dos mais altos edifícios do mundo. Foi mandado construir pelo milionário Frank Winfield Woolworth, para sediar sua empresa Woolworth. 

O edifício é um dos mais antigos e famosos da cidade, com uma arquitetura preciosa, o que levou a que fosse escolhido para diversas aparições em produções de cinema.
Saindo da zona do parque caminhámos até à margem do East River, junto à área de esplanadas dos piers. Mas ainda antes percorremos um quarteirão junto às ruas Fulton St, Front St e South St, onde se concentram uma série de restaurantes bastante apelativos, a maioria especializados em seafood. Face à proximidade do rio toda esta zona tem acesso a uma vista privilegiada que alcança as duas pontes que cruzam o East River.

A zona dos piers, sobretudo o Pier 17, é também um local de concentração de restaurantes, a maioria especializados em seafood, e que atraem sempre muitos turistas. É também especialmente emoldurada pela paisagem magnífica de um conjunto de torres na primeira linha, junto ao rio, onde se encontram fundeados alguns veleiros de grande porte.

Nos piers seguintes até ao Battery Park ficam os portos de algumas carreiras de barcos e ferries para acesso a Staten Island, à estátua da liberdade ou para cruzeiros à volta de Manhattan.


Entretanto saímos da zona marginal e deambulámos pelo chamado Financial District, sobretudo a zona mais próxima do coração da finança nova-iorquina, o Wall Street.

Além de um conjunto quase infinito de escritórios de instituições financeiras, o centro desta zona fica na interceção das ruas Wall St, Nassau St e Broad St, onde se localizam o Federal Hall e o New York Stock Exchange.

O Federal Hall foi construído no ano de 1700 como sede do governo da cidade de Nova Iorque, e mais tarde serviu como primeiro edifício do Capitólio dos Estados Unidos, e foi mesmo neste local que George Washington tomou posse como primeiro presidente dos Estados Unidos. 

No entanto o edifício original seria demolido e seria construído depois, em 1842, o edifício atual, que funciona como museu comemorativo e memorial ao antigo Federal Hall e a George Washington.
O New York Stock Exchange (NYSE) ou Bolsa de Valores de Nova Iorque, fica um pouco à frente do Federal Hall, na Broad Street. A NYSE, que é atualmente administrada pela NYSE-Euronext, foi criada em 1792 e é uma das principais e das mais antigas bolsas de todo o mundo. O edifício tem uma arquitetura clássica com um conjunto de colunas gregas na sua fachada e uma imensa escultura decorativa de baixo-relevo no seu pórtico… mas o que mais se destaca é a bandeira americana gigante que cobre toda a fachada.
Um pouco mais abaixo do centro financeiro, na praça Bowling Green, exatamente onde começa a Broadway Avenue, encontramos a estátua do Charging Bull, o “Touro de Wall Street”, uma escultura de bronze com 3,5 toneladas, medindo 3,4 m de altura e 4,9 m de comprimento. 

O touro foi concebido pelo artista italiano Arturo de Modica e foi instalado em dezembro de 1989, originalmente na Broad Street, em frente ao edifício da Bolsa de Valores. A instalação foi feita de forma provocatória, sem qualquer aviso prévio... num dia não havia lá nada e na manhã seguinte já lá estava o touro. 

Depois da sua instalação junto ao edifício da Bolsa, a escultura foi apreendida pela polícia de Nova Iorque e foi levada para um parque de automóveis, onde ficou alguns dias. Mas, o protesto público que se seguiu, fez com que a estátua fosse rapidamente reinstalada, mas, desta vez, dois quarteirões abaixo, no parque Bowling Green, junto à Broadway, onde se encontra atualmente.

A escultura representa um touro em posição de ataque e simboliza um mercado financeiro agressivo, o chamado bull market. O escultor idealizou a estátua logo após o crash da bolsa de valores de Nova Iorque, em 1987, a chamada "segunda-feira negra", e resolveu oferecê-la à cidade, como símbolo da força e poder do povo americano. Modica gastou (a modica quantia de) 360 mil dólares das suas economias na execução desta obra, mas certamente, de forma indireta e ao longo da carreira, terá tido um benefício significativo com a inclusão no seu curriculum deste ícone da cidade de Nova Iorque. 
O dowtown da cidade termina junto ao rio num belo jardim totalmente rodeado por arranha-céus lindíssimos, o Battery Park

Trata-se de um parque urbano com cerca de 10 hectares de área verde localizado no Sul da ilha de Manhattan, e que foi construído no início do século XX sobre um antigo aterro sanitário.

Além do Battery Park existe também o Promenade, um passeio junto ao rio que permite longas caminhadas ou passeios de bicicleta, com uma vista privilegiada da baía e da Estátua da Liberdade. Aliás, os pores-do-sol neste local, quando as condições climatéricas o permitem, são momentos muito populares entre os nova-iorquinos, oferecendo uma bela panorâmica sobre a baía. 

É também deste local que saem os barcos com destino à Liberty Island, onde se encontra a Estátua, um dos principais pontos turísticos da cidade.
Ainda em pleno Battery Park existia também uma escultura designada por “The Sphere” do escultor alemão Fritz Koenig. A escultura foi montada originalmente em Bremen e trazida depois para Manhattan. A obra de arte deveria simbolizar a paz mundial e foi colocada junto às antigas Twin Towers, no centro de um anel de fontes, projetado pelo arquiteto do World Trade Center, Minoru Yamasaki.

Depois dos ataques do 11 de setembro a escultura foi recuperada de uma pilha de escombros, desmantelada e enviada para um armazém. Entretanto, como se tratava de um objeto que preservava a memória daquele local, a escultura acabou por retornar a Manhattan apenas seis meses depois do ataque, e foi novamente erguida, desta vez no Battery Park, a alguns quarteirões do local onde se encontrava anteriormente. O próprio Koenig supervisionou esse trabalho de remontagem da escultura que passou a ser um memorial às vítimas dos ataques. Koenig disse "Era uma escultura, agora é um monumento", "Agora tem uma beleza diferente, que eu nunca poderia imaginar. Tem a sua própria vida, diferente da que eu lhe dei". 

Foi este o símbolo, bem mais que uma escultura, que encontrámos nesta zona da cidade.
Mais tarde, em 2014, com a inauguração do One World Trade Center (5 anos depois da nossa visita à cidade), foi criado um memorial às vítimas na zona do Ground Zero, e a “The Sphere” foi mudada para o Liberty Park e foi integrada nesse imenso memorial.

Ainda pela zona do downtown, enquanto percorremos um conjunto de ruas, sempre emparedadas por arranha-céus gigantes, surge-nos inesperadamente uma igreja do século XVIII. A Trinity Church é uma capela pertencente à Igreja Anglicana localizada bem no coração da finança de Manhattan, no cruzamento entre a Wall Street e a Broadway Avenue.
E apenas a alguns quarteirões chegámos ao imenso estaleiro do novo World Trade Center. O local onde outrora se ergueram as torres gémeas (que pude visitar em 1996), o palco de uma das catástrofes mais marcante para todo o mundo ocidental, mas que hoje não é mais que um estaleiro de obras, com gruas e contentores, e com a estrutura da nova torre a emergir do imenso buraco que ficou conhecido como Ground Zero
Não sentimos a importância e a carga emotiva daquele local... penso que nem quiséssemos mesmo sentir o dramatismo que lhe está associado, talvez porque todos nós já tivéssemos feito o luto que aqueles acontecimentos justificavam. Mas talvez mais tarde, com a inauguração do edifício e a criação de um memorial, esse exercício de reflexão volte a ser possível... talvez mesmo inevitável.

O nosso grupo era constituído por cinco engenheiros civis e uma médica e, por isso, não descansámos enquanto não estávamos dentro do estaleiro a fazer perguntas ao encarregado.
Entre as várias informações que nos transmitiram sobre o novo projeto e sobre a construção, e que vos vou poupar, por serem demasiado exclusivas de quem anda nesta coisa das obras, mostraram-nos ainda algumas imagens virtuais do edifício que virá a ser o futuro One World Trade Center.