Acordámos já em Fort William pois queríamos estar junto ao Viaduto Glenfinnan às 10h15, a hora certa para ver passar o comboio a vapor que, no imaginário de todos, vai a caminho de Hogwarts, a famosa escola de magia do universo Harry Potter, transportando mais uma nova turma de futuros feiticeiros.
Tínhamos programado este dia para conhecer a parte mais Ocidental das Terras Altas escocesas, a West Coast Highlands, chegando ao final da tarde a Glasgow, a segunda cidade da Escócia.
Cumprimos os objetivos planeados e percorremos os trilhos marcados a azul no mesmo mapa da Escócia que nos tem vindo a acompanhar ao longo destas crónicas:
Viaduto Glenfinnan
Começámos o dia fazendo os 30 km que ficam entre Fort William e o Viaduto Glenfinnan. A ideia era conseguirmos estar na encosta sobre o viaduto exatamente às 10h15, esperando a passagem do comboio a vapor, o Jacobite Steam Train, que ficou famoso pelos filmes da saga Harry Potter, pois era este o comboio que levava os alunos para a escola de magia Hogwarts… num momento especial, que é muito mais do que estarmos apenas a olhar para um comboio antigo a deitar fumo pela chaminé.
Para chegarmos até ao viaduto estacionámos perto da estrada, onde há um estacionamento pago, £3,50 para o dia todo. Depois fizemos o percurso até à base do viaduto, que demorou cerca de 20 minutos, e a seguir subimos a colina para arranjar o melhor ponto de observação para ver o comboio a passar. Se estivesse uma manhã chuvosa, o que seria muito provável, ou não estivéssemos na Escócia, iriamos começar o dia logo todos enlameados… mas, por milagre, estava um lindo dia de Sol e ainda nos bronzeámos enquanto esperávamos a chegada do comboio, algo raro em terras escocesas.
O comboio que passa de manhã sai de Fort William, e vem de Este para Oeste, ou da direita para a esquerda, quando olhamos para o viaduto enquanto nos aproximamos. Mais tarde, já depois da hora de almoço, volta a passar, mas no sentido contrário.
A subida é uma festa, com muita gente animada a ocupar os seus lugares, com várias famílias com miúdos, aguardando pela carga de magia que a passagem daquele comboio vai trazer.
Depois é só esperar, ficando a apreciar as belíssimas paisagens da envolvente, não só do próprio viaduto, mas também das montanhas, ainda cobertas de neve nesta altura. Não sei se será habitual o comboio não chegar a horas, mas, desta vez, parecia um comboio da CP, chegou com quase 40 min de atraso, deixando toda a gente um bocado ansiosa.
Mas ao final deste longo atraso lá começámos a ouvir os ruídos de uma composição pesada que se aproximava. Logo de seguida parou já sobre o viaduto e começou a preparar a “mise en scène”, aumentando gradualmente a quantidade de fumo que saía pela chaminé, até retomar a marcha e fazer a sua passagem triunfal, já a todo o vapor, para satisfação e alegria de todos os que ocupavam a encosta, mas também para os próprios passageiros do comboio que acenavam com entusiasmo.
Foi um momento emocionante, talvez tenha sido ainda potenciado pelo atraso, que já nos estava a fazer desacreditar que iriamos mesmo conseguir entrar nesta encenação, quase como quem participa num dos filmes da série, fantasiando que ali iam mesmo os novos alunos do curso de magia a caminho de Hogwarts.
À saída do viaduto regressámos ao estacionamento onde se encontra uma pequena colina com acesso pedonal. Subimos a pé até ao miradouro que fica no topo, e aproveitámos para apreciar as paisagens mais bonitas que podem ser vistas nesta zona… dum lado temos uma outra perspetiva do Viaduto e, do outro lado, temos a vista sobre a imensa baía onde se destaca um monumento, que a esta distância nos parece uma espécie de obelisco.
Este monumento, o The Lone Scotsman Jacobite Memorial, foi erguido em homenagem aos 1200 highlanders que se reuniram neste local antes de se dirigirem para a batalha de Culloden, uma das mais sangrentas da história do Reino Unido, onde os ingleses massacraram os escoceses… e cujo campo de batalha visitámos (tal como se encontra mencionado na crónica sobre a visita às Highlands).
A Revolução Jacobita surgiu quando os escoceses apoiaram o príncipe Charles Edward Stuart, uma das figuras heroicas da Escócia, tentando que este tomasse o trono inglês, derrubando o poder protestante e transformando o país numa monarquia católica. Décadas depois a causa foi continuando embora o príncipe que pretendiam ver coroado tivesse sido substituído pelos sucessivos herdeiros.
E foi aqui, nesta baía, que os cerca de 1200 apoiantes da causa Jacobita, se reuniram antes de percorrerem os mais de 130 km, grande parte ao longo do Loch Ness, até chegarem a Culloden, onde aconteceu aquela que seria a última batalha e o fim do movimento Jacobita… num desfecho que durou apenas 40 min, em que a força inglesa, muito mais poderosa e numerosa, dizimou os combatentes Jacobitas.
O monumento que encontramos nesta bonita enseada do Loch Shiel, é uma homenagem aos homens que aqui se reuniram, numa despedida antes daquela que seria a sua última batalha, e onde todos acabariam por morrer.
Glen Nevis
Fizemos depois o trajeto de volta a Fort William, um nome que vem do forte original que ali foi construído em 1654 para manter a paz nas Terras Altas. Mais tarde, este forte iria ser destruído, e reconstruído de novo, tendo funcionado, depois disso, como a principal prisão britânica nesta região.
As montanhas, os vales e as quedas de água de Glen Nevis, são a principal atração desta zona, e quisemos explorar alguns dos trilhos de caminhada que aqui existem, mas admito que poderia ser difícil fazê-lo, caso estivesse a chover torrencialmente, mas, felizmente, estava um dia bom, e lá partimos à aventura.
Começámos por uma estrada ainda razoável durante 9 km, que vai percorrendo um imenso vale e onde somos acompanhados por paisagens sempre bastante bonitas.
No troço seguinte, depois de termos chegado ao Lower Falls Car Park, começa uma daquelas estradas muito estreitas onde só passa um carro de cada vez, e seguimos por aí mais cerca de 3 km até ao Steall Waterfall Car Park, onde deixámos o carro… neste local de estacionamento, que não é organizado nem pago, a coisa pode não ser fácil e pode obrigar a algum tempo de espera, mas até tivemos sorte e arranjámos logo lugar.
Depois disso seguimos a pé cerca de 2 km, começando por subir toda uma colina, para mais à frente a descermos, até chegarmos à queda de água Steall Waterfall, a segunda mais alta de toda a Escócia.
A cascata é visível na parte final do caminho pelo que, nem todos continuam mesmo até à zona da queda de água. Mas quem quiser chegar até ao fim, como nós quisemos, tem ainda um novo desafio para vencer… é que o caminho é cortado pela passagem de um rio.
E assim, dispostos a qualquer desafio, lá tivemos que alinhar naquela que é a única alternativa que nos é dada para atravessar o rio, utilizando uma ponte rudimentar de cordas, cuja travessia obriga a alguma destreza (bem, não será exatamente de cordas, apesar de se chamar, Glen Nevis Rope Bridge, na verdade, é feita de cabos de aço)… mas lá fomos e conseguimos atravessar para a outra margem, e depois repetir a façanha no regresso.
Já na outra margem tivemos ainda que percorrer os trilhos junto ao rio que nos conduziam até à cascata, que ali era completamente dominante, quer pela sua envergadura imponente quer também pelo rugido ensurdecedor que a queda das águas provoca.
Já na base da cascata, é agora o momento certo para uma paragem mais demorada, para descansar um pouco, ou mesmo para algum tempo de reflexão ou, se possível, podemos ainda aproveitarmos para um lanchinho à beira das águas.
Glencoe
Depois de regressarmos a Fort William entrámos na estrada nacional que liga as Terras Altas a Glasgow, ao longo da qual fizemos várias paragens, a primeira das quais em Glencoe.
Neste local quisemos fazer mais uma pequena caminhada, esta de apenas 800 m, contornando as margens do bonito lago que ali se encontra… podia ser só mais um lago dos muitos que temos vindo a apreciar, mas é muito mais que isso, talvez por estar resguardado dos ventos, as águas revelam-se como um autêntico espelho, e as paisagens na sua envolvente tornam-se perfeitamente extraordinárias.
Three Sisters Viewpoint
Voltando à estrada A82, que nos leva para Sul, vamos agora atravessando o bonito vale do River Coe, onde fomos parando várias vezes para aproveitar as belas paisagens que nos são oferecidas.
Mais à frente paramos no principal spot deste local, em frente a três conjuntos montanhosos chamados de Three Sisters, lindíssimos e impressionantes, sobretudo pela sua grandiosidade.
Foi pena não termos apanhado uma Escócia verdejante, porque seria ainda mais bonito. E também foi pena já não termos tempo para ensaiarmos mais uma caminhada nesta zona do vale, para experimentarmos a imersão pelos trilhos que percorrem a base desta extraordinária cordilheira… mas acabámos por ficar apenas cá em baixo a apreciar a paisagem lá no alto destas três belas montanhas.
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The Meeting of Three waters & Pass of Glencoe waterfall
Faltavam ainda dois pontos de paragem muito breves. O primeiro é formado por um conjunto de quedas de água, as chamadas cataratas de Glencoe, também conhecidas como Encontro das Três Águas do rio Coe.
Este é um local de fácil acesso, pois fica mesmo encostado à estrada, mas, na verdade, deixou-nos um pouco desiludidos, pois tinha visto fotos que mostravam quedas de água abundantes, mas, nesta altura, o que encontrámos não era mais do que um pequeno riacho a correr pela montanha.
Devil's Staircase Car Park
Um pouco mais à frente parámos numa zona de onde saem alguns trilhos para caminheiros mais experientes, nomeadamente o Devil's Staircase, uma caminhada famosa com 9 km, que vai até a um miradouro acima do topo da Escadaria do Diabo… mas não nos metemos ao caminho, já não cabia no nosso programa para este dia.
Limitámo-nos a apreciar a paisagem meio bizarra que dali se pode ver, com uma única casa no meio de um vale imenso… ideal para quem se dá mal com a vizinhança.
A cerca de 60 km para Sul começámos a encontrar o Loch Lomond, que funciona como zona balnear e cujas margens vamos percorrendo até chegarmos perto de Glasgow, onde terminámos mais um excelente dia por terras escocesas.