Vereda da Ponta de São Lourenço
Ao segundo dia desta viagem resolvemos explorar a extremidade Este da ilha da Madeira, percorrendo a pé toda a vereda que se forma ao longo da península de São Lourenço, batizada com o nome da caravela de João Gonçalves Zarco, um dos três descobridores desta ilha.
Quisemos fugir das horas de mais calor e também de mais gente, e ainda aproveitar as paisagens do amanhecer e, por isso, começámos o nosso percurso logo ao nascer do Sol. Eram pouco mais de 7h30m quando chegámos à baía d'Abra e tomámos o nosso pequeno-almoço, num picnic improvisado, enquanto observávamos a chegada dos primeiros raios de Sol daquele dia.
Pouco depois, quando o dia começou a clarear, partimos para uma caminhada que nos haveria de levar até ao Miradouro Ponta do Furado, situado no pico mais próximo dos ilhéus que formam a extremidade desta península.
Esta vereda tem cerca de oito quilómetros (no total de ida e volta), e percorre-se ao longo de duas horas e meia a três horas, seguindo um caminho sinuoso, entre subidas e descidas, onde os trilhos estão maioritariamente em boas condições.
O clima semiárido e a exposição aos ventos do Norte fazem com que a vegetação seja seca e rasteira, sem quaisquer árvores, numa paisagem totalmente diferenciada dos verdes vivos da maioria das encostas da ilha, e é exatamente essa singularidade que faz com que este lugar seja especial, constituindo um verdadeiro património natural.
O percurso leva-nos a escalar por trilhos que rasgam o terreno rochoso e escarpado, num cenário grandioso, ao longo de toda a baía d'Abra, onde se consegue ver o imenso rochedo vulcânico que ali se eleva, mostrando ao mesmo tempo as partes Norte e Sul da ilha.
Ao longo da caminhada vamos encontrando alguns miradouros onde as paisagens se tornam ainda mais magníficas, como acontece logo no Miradouro de São Lourenço, com vista para a baía que se forma do lado Note da península, onde encontramos alguns rochedos que nascem no mar, que, deste lado, estava mais calmo e, por isso, ainda mais azul.
Mais à frente, e depois de escalarmos a subida seguinte, voltamos a poder contemplar esta mesma baía do lado Norte, em toda a sua extensão.
O miradouro seguinte, ainda do lado Norte da costa, mostra-nos uma baía conhecida pelo rochedo que ali se ergue, a Ponta do Castelo, que conseguimos também observar mais tarde, já da escarpa do lado oposto.
É nesta zona que o percurso se torna mais arriscado. O rochedo que separa o mar entre o Norte e o Sul, surge aqui como uma linha bastante estreita, e a uma cota muito alta, por onde passa o trilho, dando-nos a sensação de caminharmos no limite de duas ravinas, uma para cada lado. Apesar de tudo, existem guardas de segurança em todo o percurso desta travessia que nos dão uma certa tranquilidade, sobretudo se evitarmos olhar para baixo… parando apenas quando nos sentirmos seguros, para então voltarmos a observar o mar lá em baixo, com o rochedo da Ponta do Castelo ao fundo.
Depois de mais um troço pelos trilhos que rasgam as encostas seguintes, desta vez são ainda estreitos e um pouco difíceis, chegámos ao último maciço desta caminhada, onde teremos a opção de fazer um percurso circular, descendo por um lado e subindo depois pelo outro lado. É também aqui que aparece uma placa que anuncia a existência de um café… para quem mediu mal as provisões de água para a viagem, a existência deste café foi completamente providencial, apesar dos 4€ que tivemos que pagar por uma garrafa de litro e meio.
Neste ponto podemos escolher se queremos ir diretamente para o pico onde atingiremos a metade da caminhada, ou se iremos primeiro a uma pequena praia, a Praia da Sardinha, onde encontramos um cais que facilita o acesso ao mar. Alguns caminhantes sobem primeiro ao pico e passam depois pela Praia da Sardinha, onde aproveitam para dar uns mergulhos refrescantes. Nós preferimos fazer de forma inversa, tínhamos outros planos para uns mergulhos mais tarde e ficámos aqui apenas para um picnic improvisado, numas mesas previstas para esse efeito, de onde conseguíamos observar de novo as encostas da Baía d'Abra e a Praia da Sardinha lá em baixo.
Depois desta pausa nem imaginávamos como seria difícil a escalada do pico onde fica o Miradouro Ponta do Furado. Não parecia nada de mais, mas acabou por ser muito penoso, sobretudo porque a qualidade do trilho é aqui bastante má, obrigando-nos praticamente a escalar esta rampa íngreme e sinuosa, numa altura em que se começou a levantar um vento forte.
No final lá chegámos, cansados e, no meu caso, um pouco afetado pela sensação de vertigem… tirei umas fotos aos rochedos que formam as ilhas onde termina a Ponta de São Lourenço, espreitei ainda ao longe as Desertas e o Porto Santo, e fugi rapidamente daquele miradouro onde me estava a sentir um pouco desconfortável.
A descida foi mais tranquila, apesar da dificuldade do trilho, permitindo ainda voltar a observar a imensa paisagem que nos envolvia, onde encontramos de novo a Baía d'Abra à distância, onde são visíveis os viveiros de douradas que serão mais tarde vendidas nas lojas Pingo Doce por todo o país.
O regresso é quase um alívio, depois daquela subida ao pico agora tudo nos parecia super fácil, apesar de faltarem ainda quatro quilómetros.
Ao chegar, verificámos que o espaço de estacionamento estava completamente preenchido para além dos seus limites, com carros e autocarros de turismos, o que nos reforçou a ideia de que escolhemos bem em ter começado esta aventura logo ao nascer do Sol.
Para terminar esta manhã iriamos ainda visitar mais um miradouro, mas de carro, neste caso na Ponta do Rosto, onde podemos observar a baía do lado Norte da península de São Lourenço, um espelho de água onde nascem vários rochedos, e que aqui nos surge com mais amplitude e de um angulo diferente.
Por fim, e cumprindo os planos que tínhamos feito, parámos ainda na Prainha, uma praia de areia preta, mas fina, já próxima do Caniçal. Com as águas a uma temperatura fantástica, não nos poderiam ter sabido melhor aqueles banhos que ali tomámos e os mergulhos que lá demos… que melhor maneira para terminarmos esta manhã extraordinária!
E agora íamos ainda ao restaurante do Golf do Santo da Serra para usufruir das paisagens daquele local enquanto almoçamos… dando a nós próprios uns mimos que serão mais do que merecidos.
Vivemos momentos de grande cansaço e até alguns instantes de descontrolo e vertigem (se calhar isso só aconteceu comigo), mas, fazendo um balanço final, tratou-se de uma experiência perfeitamente fantástica, numa entrega total e profunda aos pormenores com que a natureza nos foi brindando ao longo de todo o percurso… saímos daqui muito mais ricos e de alma cheia.
Levadas do Risco e das 25 Fontes
Os percursos destas duas levadas, em conjunto, levam a uma caminhada de cerca de 10 km (no total de ida e volta) com início na Estrada Regional 105, onde encontramos um espaço para estacionar. Depois seguimos por uma imensa descida que rasga o vale, ainda numa estrada pavimentada, mas já totalmente envolvida na densa vegetação, aqui, mais do que noutros lugares, um verdadeiro exemplo da floresta endémica da ilha, a Laurissilva.
Ao fim de cerca de dois quilómetros chegamos à Casa-Abrigo do Rabaçal, um restaurante que serve de apoio aos caminheiros. A partir daí entramos no caminho das levadas, bem mais plano, acompanhando apenas o declive que vai levando a água das nascentes destes vales para outros lugares da ilha, neste caso vão alimentar a central hidroelétrica da Calheta, seguindo depois para a rega dos campos agrícolas.
Num determinado ponto os dois trilhos separam-se seguindo em duas levadas paralelas localizadas a diferentes cotas. Aí continuámos na cota superior, pela levada do Risco, mantendo um percurso muito tranquilo que nos levaria até ao Miradouro da Cascata do Risco, seguindo as belas paisagens sobre o vale que nos vai acompanhado.
Mais à frente começamos a ouvir o ruído permanente de uma queda de água e começamos também a observar ao fundo as primeiras imagens da imensa cascata que ali se forma.
Logo depois avistamos a impressionante queda de água, um rio que se projeta na vertical formando um risco ao longo da rocha, que lhe dá o nome de Cascata do Risco.
A paisagem é inacreditável, quase nos falta o ar de tanta beleza, sentimo-nos pequeninos no fundo daquele imenso rochedo sob a água que ali chega em queda livre.
Estávamos relutantes em deixar este local e perder esta imagem avassaladora, muito mais impactante quando ali estamos, com o ruído da água a cair e a humidade que nos envolve, do que qualquer fotografia conseguirá reproduzir. Sentia-se uma atração por aquele fim do mundo com pinceladas de paraíso, e não queríamos ir embora.
Mas o tempo não pára e o regresso era inevitável, tanto mais que tínhamos ainda uma outra levada para explorar, e lá partimos de regresso ao ponto onde iríamos entrar no trilho da Levada das 25 Fontes.
Toda a ilha da Madeira está cheia de levadas, um conjunto de caleiras e aquedutos, sempre acompanhadas por trilhos apertados, que formam uma vasta rede de irrigação, levando as águas das suas nascentes e ribeiros mais abundantes, para outras zonas da ilha, permitindo depois a rega dos campos de cultivo.
Algumas destas levadas foram construídas ainda no século XIX e sempre à força de trabalho braçal pelos bravos habitantes da ilha, obrigando, tantas vezes, a abrir túneis na rocha, de forma a ultrapassar as zonas com uma orografia mais complicada.
A levada das 25 Fontes, também conhecida por levada Nova do Rabaçal, é bastante antiga… desde 1855 que vem correndo água por esta levada do lado Norte da ilha para o Sul.
Quando entramos neste trilho, deixando o caminho quase plano da levada do Risco e começamos a descer o vale por uma escadaria que parece não acabar, já pensando que, mais tarde, teremos de a subir de volta. Ao fundo da escada chegamos à ponte que atravessa o ribeiro e atingimos o patamar da levada, por onde vamos continuar a caminhada, sempre acompanhando a paisagem do vale, com um verde muito vivo, e ainda com a imagem ao fundo da cascata do Risco.
O percurso seguinte passa a ser plano, mas nem sempre muito fácil, sobretudo nos trechos mais estreitos que dificultam o cruzamento entre caminhantes em sentidos opostos, sendo necessário, por vezes, usarmos a própria levada para nos encavalitarmos, facilitando assim a interceção.
Os últimos 1300 m requerem bastante atenção, sobretudo nas zonas estreitas que estão próximas de ravinas, apesar de existirem sempre varandins de proteção, que foram instalados e têm sido devidamente conservados e até melhorados, e que garantem a segurança deste percurso.
Mas, de vez em quando o trilho alarga, permitindo descontrair e até observar tranquilamente as paisagens dos vales envolventes, que são sempre bastante bonitas.
Chegámos finalmente à lagoa das 25 Fontes, formada pelas águas que descem do Paul da Serra e que surgem por detrás da parede de rocha que ali surge, e onde se poderá contar um total de 25 pequenas quedas de água, aqui designadas por fontes.
A chegada à lagoa acaba por ser um pouco frustrante, desde logo, porque encontramos um espaço atafulhado de caminhantes e temos até dificuldade em chegar à primeira linha desta espécie de anfiteatro, que ali se forma em torno da lagoa. Mas, aos poucos, vamo-nos aproximando e até subindo alguns degraus, o que nos permite uma panorâmica mais interessante.
Conseguimos agora contemplar o imenso buraco onde nos encontramos, a vegetação que o envolve, e lá estão as ditas fontes, não sei se 25 ou lá quantas forem, será sempre um espetáculo extraordinário.
Tendo ficado na primeira linha passámos a ter uma paisagem mais limpa e até nos esquecíamos dos caminhantes que continuavam a chegar e a partir, sem grande demora e sem coragem para experimentarem um mergulho nas águas geladas que ali nos eram oferecidas.
Foi então que um único grupo se encheu de coragem, assumiu o traje de banho, e entrou na água… o grupo éramos nós próprios, isto é, todos menos eu, que fiquei cá fora para fotografar (mas cheio de pena de não ir também… esta parte não é verdade, reconheço). Foi um ato de coragem, quando as minhas meninas, mulher e filhas, deixaram todos os caminheiros que observavam a lagoa de boca aberta, afinal estas três miúdas tinham mais coragem do que todos eles… foi um orgulho. E eu lá fiz o meu papel, fotografando para memória futura.
Depois do banho gelado a energia foi reposta e preparámo-nos para o regresso. O caminho de volta requer alguma condição física, inclui a subida de uma imensa escadaria de pedra até chegarmos de volta à Casa-Abrigo do Rabaçal, onde podemos finalmente descansar ou até aproveitar para um lanche ou mesmo para almoçar.
Faltavam ainda os últimos dois quilómetros, já em estrada pavimentada, mas sempre, sempre a subir. Já não nos apetecia e não acrescentava nada à experiência, era quase uma punição extra para não termos a mania que somos aventureiros. Mas aí descobrimos que, embora este trecho de estrada esteja fechado, na verdade, estão autorizados uns minibuses que nos levam até ao estacionamento por três euros cada pessoa… e digo-vos, foi emocionante, quando nos preparamos para subir uma ladeira daquelas depois de oito quilómetros a caminhar, e nos apercebemos que, afinal, há uma carrinha que nos leva até ao topo, é de tal forma tocante, que quase me caíram as lágrimas. De qualquer forma, tinha sido uma grande aventura e uma manhã perfeitamente fantástica.
Saindo da Pousada do Pico do Arieiro, a uma altitude de 1817 m, podíamos percorrer toda a vereda que nos iria levar até ao Pico do Ruivo, num total de mais de sete quilómetros, com posterior ligação de mais três quilómetros até à Achada do Teixeira, onde se encontra o acesso à estrada. Porém, para fazermos essa caminhada, teríamos de ter uma viatura do outro lado que nos trouxesse no caminho de volta ao Arieiro, onde deixámos o carro.
Não havendo ninguém que nos conduzisse de volta, um regresso de táxi poderia ser demasiado pesado e, por isso, resolvemos fazer de uma outra forma. Assim, percorremos o primeiro troço desta vereda, apenas cerca de 800 m, até ao Miradouro do Ninho da Manta, regressando depois ao Arieiro e continuando de carro.
Mais tarde, faremos ainda a vereda do Pico do Ruivo, que nos vai levar até ao topo da montanha mais alta da ilha. Mas, por agora, vamos aproveitar esta manhã fantástica, com uma boa visibilidade, para apreciarmos as paisagens deslumbrantes que nos são oferecidas (meu Deus, tantos adjetivos!)… mesmo sendo apenas num pequeno troço de menos de um quilómetro que nos separa do Miradouro do Ninho da Manta.
A paisagem é caracterizada pela vegetação típica destas zonas de montanha, onde predomina o urzal de altitude, com destaca para a Urze, a Violeta da Madeira e a Orquídea das rochas.
O trilho encontra-se devidamente assinalado, atravessando um troço sobre a cumeeira, separando dois vales profundos, um de cada lado, dando uma sensação vertiginosa, que nos enfraquece as pernas com um nervoso-miudinho.
Para contornar os rochedos que nos vão surgindo pelo caminho, seguimos agora por trilhos estreitos que são esculpidos rasgando as encostas lateralmente.
Chegando ao miradouro onde supostamente nidificava a ave de rapina chamada de Manta, resolvemos ficar algum tempo a desfrutar da vista fabulosa que nos é oferecida, e que quase nos faz arrepiar pela sua grandeza, com uma paisagem infinita sobre o vale da Fajã da Nogueira, São Roque do Faial e grande parte da Cordilheira Montanhosa Central.
Depois de algum tempo no miradouro aproveitando e inspirando fundo os aromas desta manhã fantástica, resolvemos regressar, com bastante pena de não seguirmos o caminho até ao pico do Ruivo, mas teríamos de cumprir o que tínhamos planeado por razões logísticas imperativas.
No final, mostrávamos o nosso contentamento, enquanto os trilhos desta caminhada começavam a ficar completamente preenchidos por extensos grupos de caminheiros.
Fechámos assim esta belíssima manhã num dos mais belos locais da ilha da Madeira, embora com uma sensação de que teria sido muito melhor se tivesse sido possível fazer toda a vereda até ao pico do Ruivo. De qualquer forma, dividindo esta caminhada neste troço no Arieiro, e no acesso ao pico do Ruivo, que iriamos fazer mais tarde, acreditávamos que o resultado final haveria de ser suficientemente compensador e estimulante.
Vereda do Pico Ruivo
Saímos da Achada do Teixeira a 1535 m de altitude, onde pudemos deixar o carro num amplo espaço de estacionamento. Começámos depois a caminhar por um trilho bem demarcado que vai subindo ao longo da crista da serra que separa as encostas de Santana e do Faial, numa distância de 2,8 km, que nos iria levar ao cume mais alto da Madeira, o Pico Ruivo, com os seus 1862 m.
No início do percurso tinha caído um forte nevoeiro e começámos a temer que fechasse ainda mais e que ficássemos completamente sem visibilidade.
Ainda houve quem quisesse desistir, acompanhando o que vimos outros grupos fazerem, mas não queríamos morrer na praia, nem que, no final, o resultado fosse dececionante.
Ao longo da subida vamos encontrando alguns pequenos abrigos para garantir a proteção dos caminhantes, quando chove ou se a montanha ficar mergulhada num mar de nuvens. Mas quando vimos a primeira dessas construções, percebemos que o tempo estava a virar e as nuvens estavam a descer pelas encostas, sendo possível voltar a ver o sol.
Começou então a formar-se um denso manto de nuvens que se posicionava abaixo da vegetação que nos envolvia, de novo a urze, o arbusto que faz parte da floresta Laurissilva, desta vez parecendo nascer de um imenso colchão de algodão.
O percurso não é difícil, sobretudo porque tem um bom caminho, quase sempre empedrado, no entanto, trata-se de uma subida constante até ao pico mais alto da ilha e, por isso, será muito mais fácil no trajeto de volta, quando for sempre a descer. Agora, na subida, soube-nos bem uma paragem na casa refúgio do Pico do Ruivo, com um bar, água potável e até casas de banho, para refrescarmos e prepararmos a escalada final.
Depois da paragem na casa-abrigo a subida até ao pico torna-se mais íngreme e, pelo caminho, somos ainda desafiados a estender a nossa caminhada, quando encontramos os acessos a outros três percursos: A Vereda da Encumeada, um longo trilho que chega a uma parte central da ilha, que já visitámos; a Vereda da Ilha, em torno da freguesia do concelho de Santana com o mesmo nome e; a mais importante, a Vereda do Pico Areeiro, com mais de sete quilómetros, a mesma que tínhamos começado por explorar nesta mesma manhã, mas que já nos parecia ter sido há vários dias.
Deixámos estas encruzilhadas para trás e seguimos firmes até ao topo, num troço mais difícil, mas não muito extenso e, pouco tempo depois, estávamos a atingir a plataforma final que materializa o Pico do Ruivo, o ponto mais alto da ilha da Madeira e o terceiro em todo o país.
Já no topo, a cota mais alta é assinalada por um marco geodésico e encontramos alguns miradouros que facilitam a observação em todas as direções.
Num dia de boa visibilidade conseguiríamos ver quase toda a ilha a partir daqui, mas hoje era um dia diferente e talvez ainda mais deslumbrante, com as imagens do manto de nuvens baixas que cobriam os vales, deixando apenas à vista os picos e montanhas que se salientavam ao longo da paisagem.
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Entre todas as imagens que nos eram oferecidas, destaca-se a do Pico Arieiro, que se mostrava timidamente por detrás do manto de nuvens que ainda o ia envolvendo.
Uma última foto no ponto mais alto da ilha e começámos a descida, muito mais fácil, primeiro até ao refúgio e, depois, até ao carro na Achada do Teixeira.
Desviámos apenas ligeiramente para apreciar uma formação rochosa basáltica que ali se encontra e que, pela sua forma, é conhecida como o Homem em Pé.
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Daí para baixo o percurso foi feito com uma ligeireza surpreendente, talvez com a ajuda de todos os santos, como diz o povo.
Fechávamos assim a ponta final de um percurso feito a dois tempos, que nos levou a desfrutar de uma paisagem de montanha deslumbrante, ao longo de todo o maciço central e entre os dois picos mais importantes da ilha, do Arieiro ao Ruivo.
Vereda dos Balcões
Nesta viagem em 2021 resolvemos não repetir alguns dos trilhos que já tínhamos percorrido há mais de 20 anos. Foi o que aconteceu com a Vereda dos Balções e com a Levada do Caldeirão Verde, dois percursos que já tínhamos feito e, por isso, não repetimos desta vez, mas cujas crónicas irei aqui registar, embora sem o detalhe nem a quantidade de fotos com que tenho vindo a descrever cada local visitado.
A Vereda dos Balcões é um pequeno trilho que começa junto à estrada, no Ribeiro Frio, e é bastante fácil e quase sempre plano, com apenas 3 km (1,5 km para cada lado), acompanhando a chamada Levada Velha.
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Na altura fomos acompanhados por três crianças, as minhas filhas Alice, Madalena e Beatriz, que agora repete a viagem connosco, juntamente com a minha outra filha, a Marta, que ainda não tinha nascido na época desta caminhada.
No final do percurso atingimos o Miradouro dos Balcões, onde conseguimos chegar tranquilamente... embora com algum esforço para a mais pequenota.
Ao longo do percurso são encontradas espécies endémicas da Madeira, pertencentes ao seu ecossistema, a Floresta Laurissilva, destacando-se algumas espécies arbóreas da família das Lauráceas, como o Loureiro, o Til ou o Vinhático, entre outras espécies de arbustos, plantas ou flores, como o Urze ou a Orquídea da Serra.
Independentemente de todas essas espécies, que nos baralham um pouco, este é um local onde mergulhamos verdadeiramente na floresta mais típica da ilha, a Laurissilva.
No final do percurso, e já no Miradouro dos Balcões, encontramos um cenário fantástico, sobretudo se estiver um dia limpo, com um conjunto de vales verdejantes e a Cordilheira Central da ilha, com os dois picos mais altos, o Pico do Areeiro (1817 m) e o Pico Ruivo (1861 m).
Na nossa visita no ano 2000, o dia estava limpo e a visibilidade era perfeita.
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Levada do Caldeirão Verde
Foi a caminhada mais arrojada que fiz durante a minha estadia na Madeira no início dos anos 2000. É uma levada longa, com cerca de seis quilómetros e meio para cada lado, o que leva a uma duração total de mais de cinco horas.
Esta levada tem início no Parque Florestal das Queimadas e vai sempre acompanhando uma vista espetacular dos vales que se formam no interior da ilha. A vegetação, que faz parte da Floresta da Laurissilva, envolve grande parte do caminho e é sempre muito densa, chegando a formar uma espécie de túneis.
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Esta levada constitui uma importante via no interior do vale profundo da Ribeira de São Jorge e dá-nos uma excelente visão da orografia e da vegetação desta zona da ilha.
Ainda no início do percurso podemos avistar um pequeno povoado, a chamada Achada do Marques, onde são visíveis alguns palheiros e armazéns de apoio agrícola, construídos segundo a tradição das casas típicas de Santana, porém, sem qualquer revestimento em colmo e decoração exterior de paredes.
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Durante o percurso, sempre acompanhando a caleira que forma a levada de água, vamos atravessando algumas ravinas um pouco assustadoras, mas encontramos sempre guarda-corpos de proteção, e há imediatamente uma tendência para nos encostarmos ao lado interior, por onde passa a levada. (Mas chamo à atenção para o perigo desta e de outras levadas e veredas, se não forem seguidos os trilhos e não forem consideradas as indicações de segurança.)
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O trilho é bastante longo e vai-nos oferecendo algumas paisagens diferenciadas, com pequenas quedas de água e alguns túneis. São exatamente quatro os túneis que atravessamos, sempre escavados na rocha de forma artesanal e com um aspeto algo medonho. Uns são mais extensos e, naquela época, obrigavam a levar uma lanterna, agora basta a luz do smartphone para evitar uma queda ou uma batida com a cabeça na rocha, mas, de qualquer maneira, será sempre necessário ter atenção ao piso escorregadio.
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Depois de se passar pelo último dos quatro túneis, surge à nossa esquerda a queda de água do Ribeiro do Caldeirão Verde que se projeta verticalmente por quase 100 m e cai sobre a lagoa que ali se forma… numa imagem que se assemelha realmente a um enorme caldeirão, marcado pelos tons verdes de toda a encosta e das águas da lagoa.
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Depois de algum tempo junto ao Caldeirão Verde, para baixar a adrenalina e apreciar a paisagem, era hora de regressar e percorrer o mesmo trilho até ao Parque das Queimadas, terminando assim a primeira grande caminhada que fiz nesta ilha.
(esta caminhada foi feita na companhia do meu colega e amigo Sérgio Cruz, que aqui recordo com saudade)