A Capadócia é a grande atração da Turquia Central, um lugar incrível, prodigiosamente esculpido pela natureza, com longos vales adornados por formações geológicas fabulosas e jamais vistas, que fazem com que este local nos impressione....é impossível ficarmos desapontados face à riqueza do esplendor artístico e quase divino que a natureza ali deixou.
E à medida que percorremos as terras da Capadócia vamos encontrando várias formações rochosas com diferentes morfologias, das ravinas onduladas, às cidades subterrâneas, das misteriosas igrejas esculpidas na rocha, às chaminés salientes, com diversas formas e tonalidades.
Encontramos de tudo isso ao longo desta região, normalmente vamos de carro ou de autocarro mas, sempre que paramos junto às principais atrações, avançamos depois por percursos pedestres, ou podemos também escolher outras alternativas, como passeios a cavalo ou de moto-quatro, e ainda, claro, os incríveis passeios de balão de ar quente, nos quais se sobrevoa uma parte destas joias da natureza.
Há muitos milhares de anos um grupo de vulcões ancestrais, o Monte Ercyies, o Monte Hasan e o Monte Melendiz, estiveram sujeitos a sucessivas erupções, criando espessas camadas de cobertura de cinzas, tufos vulcânicos e magma, que se depositaram sobre aqueles terrenos ao longo de muitos quilómetros.
Através dos séculos, o vento, a chuva e os cursos de água, foram provocando a erosão das rochas mais macias, como são os tufos, mas sem remover as partes de magma, mais resistentes, esculpindo assim algumas formas pouco comuns, desfiladeiros espetaculares com ravinas onduladas, saliências rochosas e pináculos de rocha, as chamadas chaminés, e todo este conjunto forma a espetacular paisagem, quase lunar, da região da Capadócia.
Mas a Capadócia também tem uma influência bem marcada por parte dos seres humanos, que foram esculpindo grutas nas rochas, formando assim as suas próprias casas, e até aldeias inteiras debaixo de terra. Ainda hoje, muitos dos pináculos que apresentam reentrâncias escavadas na rocha, são utilizados pelas populações como armazéns de provisões para os Invernos.
Com tudo isto, são várias as atrações que podemos visitar na Capadócia, e foi isso que fizemos, visitámos alguns dos principais exemplos das marcas geológicas que se podem encontrar nesta região, seguindo o trajeto assinalado neste mapa:
Mas para chegarmos a esta zona da Capadócia temos que percorrer cerca de 750 km desde Istambul, embora possamos escolher a alternativa do avião, o que demora apenas uma hora. Mas o nosso percurso foi feito por estrada, uma viagem sem fim, via Ancara. Este é um dos problemas de uma visita até à Turquia mais profunda, as viagens de carro ao de autocarro são intermináveis.
Neste caso aproveitámos a viagem e, ainda antes de chegarmos à zona principal da Capadócia, parámos numa das cidades subterrâneas que ficam nessa região.
Cidades e Aldeias Subterrâneas
Estas cidades-caverna trogloditas foram criadas como forma de defesa e proteção das populações ao longo dos séculos. Eram aldeias que serviam de refúgio para pessoas e animais, mas também para os seus bens de subsistência, quando vários exércitos atravessavam a Anatólia Central pilhando e capturando pessoas para as escravizar. Nessa altura, as populações abandonavam as suas casas e escondiam-se nestas aldeias subterrâneas, preparadas para que conseguissem sobreviver bastante tempo, até que os exércitos partissem.
Por isso encontramos aldeias, ou mesmo cidades, cujo acesso para o exterior é apenas uma pequena fresta, o menos visível que pudesse ser para nunca ser descoberta.
Lá dentro encontramos espaços onde eram garantidas as condições de sobrevivência durante os períodos de fuga. E é isso que vamos visitando enquanto percorremos uma rede interminável de túneis e cavernas, onde são visíveis alguns pequenos poços de ventilação.
Nesta zona existem 36 cidades e aldeias subterrâneas, sendo algumas delas bastante amplas e profundas, como é o caso de Kaymakli, com quase 100 túneis e oito andares de caves.
E essa foi mais uma das desilusões da nossa viagem, esperávamos visitar uma das grandes cidades, ainda que não fosse Kaymakli, contávamos que fosse uma das maiores, mas acabámos numa aldeola minúscula, com pouco mais de uma dúzia de cavernas. Embora admita que nas cidades maiores continuaremos a ver exatamente o mesmo, com sucessivos túneis e cavernas, mas a verdade é que a escolha desta aldeia, quando se anunciava uma das cidades referenciadas, constituiu uma desilusão, e foi mais um argumento para tornar esta viagem à Turquia menos maravilhosa.
Museu ao Ar-Livre de Göreme
É um dos locais imperdíveis em qualquer visita à Capadócia, é de fácil acesso, fica a apenas 1,5 km da aldeia de Göreme, e foi por aqui que começámos o nosso passeio por esta região.
Trata-se de um complexo composto por grandes formações rochosas, onde se encontram 11 mosteiros localizados nas cavidades da rocha, que revelam uma parte da história riquíssima que foi vivida nesta região.
E ao entrarmos no espaço deste museu, começamos logo por nos deslumbrar com as suas particularidades naturais, os grandes maciços rochosos esculpidos pela natureza, alguns com formas bizarras. Só depois descobrimos as habitações, igrejas e mosteiros que testemunham a atividade dos ocupantes deste local durante muitos séculos.
O museu faz parte da lista de Património Mundial da UNESCO, pela quantidade e qualidade das igrejas que encontramos em cavernas escavadas na rocha, onde são visíveis alguns frescos extraordinários, que podemos observar mas não estamos autorizados a fotografar. A maioria destes frescos estão muito degradados e encontram-se em processo de restauro.
Das várias igrejas ou mosteiros que encontramos nas muitas grutas existentes neste museu, destaca-se a chamada igreja escura, ou Karanlik Kilise, um complexo monástico do século XI.
É uma igreja com uma cúpula, uma nave principal e quatro colunas e está decorada com frescos que representam cenas do Novo Testamento. Depois de ter sido abandonada, foi ocupada por pombos, cujos excrementos acumulados durante séculos protegeram os frescos existentes nas suas paredes e abóbadas. É por isso que os frescos desta igreja são os mais bem preservados de toda a Capadócia e constituem um excelente exemplo da arte do período bizantino.
No entanto, já depois dos primeiros restauros, uma parte da entrada colapsou, tornando-a totalmente desprotegida, e visível a partir da zona exterior do museu.
A visita ao museu é algo cansativa, vamos subindo e descendo sucessivas escadarias estreitas que nos levam até às cavernas, que podem ser simples habitáculos, mas também espaços de culto, com vestígios religiosos da época em que o cristianismo foi predominante nesta região da antiga Anatólia Central.
Todo o vale envolvente ao museu é constituído pelo mesmo tipo de formações rochosas, também com várias grutas que serviram de habitações para as populações trogloditas, sendo que, algumas delas, são ainda utilizadas como armazéns.
Vale Vermelho de Devrent (Vale Imaginário)
Seguimos depois num percurso de cerca de 12 km até ao Vale Vermelho de Devrent, uma zona onde a componente ferrosa dos solos estará na origem dos tons avermelhados que dominam toda a paisagem.
Uma vez mais o efeito da erosão durante muitos séculos foi esculpindo a superfície terrestre com formas inusitadas e jamais vistas noutros lugares, numa paisagem que nem parece ser deste planeta.
O Vale de Devrent é também chamado de Vale Imaginário. A verdade é que, pelo modo como esta paisagem foi moldada, os rochedos adquiriram formas estranhas que, se dermos largas à nossa imaginação, vamos conseguir identificar algumas semelhanças com certos animais.
Assim, não será difícil imaginarmos neste aglomerado de rochas um autêntico jardim zoológico, tal a variedade de bichos que é suposto identificarmos. Mas eu, que sou sempre cético nestas coisas, pouco mais vi do que uma espécie de camelo, um bocado tortuoso.
Podemos caminhar livremente entre os maciços rochosos e, mais do que bichos, encontraremos várias esculturas naturais que são típicas desta região, entre as quais, aqueles pilares rochosos que são chamados de chaminés de fadas.
Mas de qualquer forma, reconhecendo-se mais ou menos animais, este vale será sempre um espaço bastante interessante, justificando uma caminhada por entre as rochas que nos leve a apreciar as bonitas paisagens que nos são oferecidas. E foi isso que fizemos, subimos aos pontos mais altos e desfrutámos daquelas vistas magníficas.
Aldeia de Göreme
Göreme é uma das principais aldeias da Capadócia. Encontra-se na confluência de dois dos vales mais importantes da região, o Vale do Amor e o Vale dos Pombos, e está enquadrada numa floresta de chaminés rochosas, com algumas das casas a aproveitarem as próprias grutas escavadas no maciço, o que dá a esta aldeia um aspeto pitoresco de uma povoação troglodita.
Göreme encontra-se no centro da área que é varrida diariamente por mais de uma centena de balões. É por isso um dos melhores locais para se assistir ao nascer-do-sol com o céu repleto de balões coloridos, numa imagem única e extraordinária.
Nós não tivemos essa oportunidade mas, felizmente, fizemos o passeio de balão e, por isso, pudemos desfrutar das imagens magníficas sobre a aldeia a partir do alto do nosso balão.
Mas a melhor solução para uma viagem à Capadócia, que aqui deixo como conselho para todos quantos queiram visitar esta zona da Turquia, será pernoitarem na aldeia de Göreme. Assim, na primeira madrugada vão poder fazer o passeio de balão e, na manhã seguinte, terão a oportunidade de contemplar uma paisagem fantástica com o céu cheio de balões, enquanto a aldeia acorda e se mostra com um aspeto incrível, que só na Capadócia conseguimos encontrar.
Mas esta opção obriga a ficar num dos hotéis de Göreme, alguns deles aproveitam as próprias grutas existentes, estão decorados de forma luxuosíssima e dispõem de pequenos terraços que são como miradouros que oferecem um dos mais belos espetáculos do mundo.
Mas nós não tivemos essa sorte e esse é um pecado que eu não consigo perdoar….não me perdoo a mim mesmo pela escolha deficiente, ou não perdoo os organizadores do tour, por não terem sequer proposto essa alternativa.
É verdade que estes hotéis são muito mais caros do que os resorts, distantes e meio manhosos, onde somos armazenados, em conjunto com outros milhares de turistas. Mas quem faz uma viagem desta dimensão não deve depois poupar numa coisa destas, porque o prazer de passar duas noites no coração da Capadócia é algo que não tem preço.
E foi por coisas como esta, e por outras, que vou mencionando ao longos destas crónicas, que a Turquia que visitámos não foi além dum “quase” maravilhoso….quando tinha tudo para ser uma verdadeira maravilha.
Vale do Amor (Aşıklar vadisi)
O Vale do Amor é um dos lugares míticos da região da Capadócia, com uma imagem de referência que é mesmo um dos seus principais
ex-libris. Fica próximo de Göreme e costuma ser visível ao longo do percurso feito pelos balões no seu passeio matinal. Por terra pode ser visitável indo de carro ou autocarro até a um miradouro, com uma vista panorâmica sobre o todo o vale.
O nome deste vale deve-se às formações geológicas que são a marca da própria Capadócia, as chamadas Chaminés de Fadas, uma espécie de pilares rochosos, em que a parte superior tem a forma de um coração invertido.
As Chaminés de Fada, ou Pirâmides da Terra, como também são conhecidas, são torres de rocha mais macia, com cerca de três mil anos de existência, que sustentam pedras pesadas e mais duras, também de origem vulcânica, as tais que têm forma de coração invertido. Cada pedra protegeu e comprimiu o maciço subjacente durante milénios, o que fez com que a erosão se tivesse verificado à volta das pedras mas não por baixo delas, tendo assim esculpido os pilares ou torres que ali se encontram.
Além das vistas panorâmicas, quem quiser entrar nas profundezas deste vale terá de fazer uma boa caminhada, ou então escolher os passeios de cavalo ou de moto-quatro, que são muito comuns nesta zona.
E aqui volto a registar uma nova queixa sobre os percursos organizados pela Capadócia. Nem todos os autocarros levam os seus passageiros ao miradouro que fica no topo deste vale. Primeiro, porque o tempo se torna escasso, o que só acontece porque somos levados a uma fábrica de tapetes e a uma olaria, que não queríamos visitar. Depois, porque nesta zona tentam-nos vender passeios de moto-quatro. Assim, quem não participou nesses passeios quase nem viu o Vale do Amor....e lá está mais uma razão sólida para que a Turquia não se tenha apresentado assim tão maravilhosa.
E uma vez mais em jeito de conselho para futuros viajantes, optem por programas que incluam passeios pedestres por estes vales, só assim vão conhecer a verdadeira dimensão da Capadócia.
Vale dos Pombos (Guvercinlik)
O Vale dos Pombos estende-se entre as aldeias de Göreme e de Üçhisar. Trata-se de mais uma das paisagens interessantes da Capadócia, pelo conjunto formações rochosas ou chaminés que ali se erguem.
Estas chaminés, criadas a partir do vento e da erosão provocada pela água, chegam a atingir perto dos 40 metros de altura, e apresentam várias cavidades que foram ocupadas por pássaros, principalmente pombos, ao longo dos anos.
Há vários séculos que os pombos têm vindo a ocupar as rochas e falésias deste vale e as populações locais aproveitaram essa circunstância, treinando algumas destas aves como pombos-correio e usando os seus excrementos como fertilizantes para a agricultura. No entanto, atualmente, existem muito menos pombos no vale, que se tornou sobretudo num espaço turístico.
O Vale dos Pombos é um ótimo lugar para caminhadas, com trilhos bem sinalizados, num percurso de cerca de 4 km que liga Göreme a Uçhisar.
Fazendo essa mesma ligação por estrada, existem alguns miradouros, associados a cafés e pontos de venda, de onde podemos contemplar toda a panorâmica do vale. Uma das particularidades interessantes é uma árvore que encontramos, decorada com os amuletos locais, os chamados "Olhos Turcos", muito usados para afastar as invejas e o mau olhado.
Aldeia de Üçhisar
Uçhisar é uma aldeia fantástica, literalmente encavalitada em rochedos enormes que fazem lembrar a imagem de imensos castelos de pedra, aliás, Üçhisar tem mesmo o significado figurativo de "três fortalezas".
O rochedo principal que domina a aldeia tem o nome de Kale, que quer dizer castelo, em turco, porque serviu de fortaleza e refúgio em tempos passados. Os rochedos estão cheios de grutas que têm servido durante séculos para habitação e proteção e, até aos dias de hoje, estas cavidades são ainda utilizadas como casas ou armazéns para os habitantes locais.
A fortaleza é um autêntico labirinto que inclui capelas, mosteiros, zonas de habitação e armazéns, ligados entre si por uma rede de galerias empilhadas em vinte andares. Foi usado como abrigo na época hitita (cerca de 1500 aC) e, posteriormente, pelos primeiros cristãos, durante o período romano, ao longo das incursões árabes dos séculos VII e VIII e durante as primeiras invasões turcas.
A aldeia está localizada em torno de formações geológicas muito peculiares que resultam numa paisagem estranha e quase extraterrestre, mas ao mesmo tempo, também magnífica.
Uma parte destas grutas continuam ainda a ser ocupadas pela população local. Além disso, algumas das habitações trogloditas foram transformadas em hotéis de alta qualidade, nos quais gostaríamos de pernoitar.
O rochedo, tal como toda a aldeia, é bem visível durante o passeio de balão, e constitui uma das principais atrações quando vista lá do alto. Mas quando pernoitamos num dos hotéis desta aldeia, a paisagem que pode ser desfrutada logo ao amanhecer também será certamente algo de fantástico….e é por isso que Üçhisar, tal como Göreme, será um dos lugares ideais para passar a noite na região da Capadócia.
Termino com esta imagem lindíssima que mostra bem a preciosidade das paisagens que são oferecidas quando sobrevoamos este local. Porém, trata-se de uma foto que não foi tirada do nosso balão, porque não passámos por aqui, sobrevoámos terrenos em torno da aldeia de Göreme, que ficam ainda um pouco distantes de Üçhisar.
De qualquer forma, com paisagens mais bonitas ou menos exuberantes, a nossa visita à Capadócia foi algo inesquecível e o ponto mais alto desta viagem por terras da Turquia. Embora se perceba nas minhas palavras algum desagrado, sobretudo porque organização do tour não potenciou o aproveitamento pleno das maravilhas que esta região turca tem para oferecer, e isso deixou-me alguma insatisfação que ainda não ultrapassei.