Diz o ditado e é bem verdade, quando se refere ao disparate que seria alguém “ir a Roma e não ver o Papa”. Na verdade, esta referência não considera exatamente a hipótese de se ir ver o próprio Sumo Pontífice, mas, sobretudo, à obrigação de visitar a cidade do Vaticano, com a sua grande Basílica de São Pedro, a maior de todas as igrejas católicas e o berço desta religião.
Por isso, desta vez, como nas visitas anteriores à capital italiana, não deixámos de visitar a cidade do Vaticano, embora, tanto agora como das vezes anteriores, nunca tivemos a sorte de conseguir realmente ver o Papa.
Cada visita ao centro mundial da religião católica é sempre um enorme privilégio, mesmo sem ser necessário um chamamento religioso, porque, na realidade, o Vaticano não é apenas um local de demonstração da fé católica, mas também e sobretudo, um espaço incrível de concentração de arte e de cultura.
Cada visita ao centro mundial da religião católica é sempre um enorme privilégio, mesmo sem ser necessário um chamamento religioso, porque, na realidade, o Vaticano não é apenas um local de demonstração da fé católica, mas também e sobretudo, um espaço incrível de concentração de arte e de cultura.
Entrámos pela Via della Conciliazione, uma larga avenida pedonal que nos mostra ao fundo a imagem da fachada da Basílica de São Pedro… e experimentamos logo uma sensação emocionante ao primeiro contacto com aquela igreja magnifica e a sua cúpula majestosa.
Piazza San Pietro
Chegámos depois à Piazza San Pietro, a grande praça que foi decorada com a ajuda do inevitável Gian Bernini, o grande escultor romano do século XVI, que concebeu a chamada colunata, dois conjuntos de colunas, num total de 284, que acompanham o contorno oval da praça.
A praça apresenta ainda duas fontes, tal como na maioria das praças romanas, em que uma delas é também uma obra de Bernini e, ao centro, ergue-se um obelisco, mais um clássico em várias praças da cidade.
O Obelisco do Vaticano tem 40 m de altura e é um original do Egito, de onde foi trazido para Roma no século I d.C., a mando do imperador Calígula, para ser usado na decoração do seu novo circo, ou anfiteatro, que veio a ser conhecido como Circo de Calígula ou Circo de Nero, que se localizava neste mesmo local onde fica hoje a praça de São Pedro. Mais tarde, o apóstolo São Pedro haveria de ser martirizado neste circo, motivo pelo qual o obelisco ali foi guardado e reerguido, já do século XVI, por ordem do Papa Sisto V, por estar próximo do local onde ocorreu o martírio do apóstolo.
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Basílica San Pietro
A entrada neste local é sempre fascinante, mesmo para quem não seja católico, é impossível ficar indiferente perante tal grandiosidade e por toda a carga histórica e simbólica que ali se concentra. Estamos no berço da religião católica e num dos locais de culto mais importantes de todo o mundo, e isso é algo incontornável e que impressionará qualquer visitante, independentemente da sua fé.
E logo à chegada é-nos revelada a imagem inconfundível da Basílica, com a sua imponente cúpula, que nos habituámos a ver sobre os telhados da cidade, mas que agora nos surge de forma admirável, como um símbolo maior do estado católico do Vaticano, mas também da própria cidade de Roma.
As origens da basílica levam-nos a quase dois mil anos atrás, à época da morte do apóstolo, que foi crucificado e sepultado no antigo Circo de Nero, localizado neste mesmo local.
O primeiro templo a ser ali criado surgiu apenas no século IV, quando o Imperador Constantino decidiu erguer uma grande basílica dedicada a São Pedro, que iria ser o centro físico e espiritual do cristianismo.
Mas a obra da Basílica, tal como a conhecemos, foi iniciada mais tarde, no ano de 1506, por ordem do Papa Júlio II, e concluída em 1602, já no papado de Paulo V.
Do ponto de vista artístico, a basílica de São Pedro cumpre o desejo da igreja católica de se mostrar ao mundo de forma grandiosa, apresentando uma arquitetura exuberante e contendo uma coleção impressionante de obras de arte dos mais importantes artistas.
A fachada é construída em mármore branco com colunas e pilastras que suportam o pórtico central, sobre o qual surge uma balaustrada decorada com diversas estátuas, onde se incluem as figuras de São Pedro e São Paulo.
O interior da Basílica
A entrada na Basílica é gratuita (só a subida à cúpula é cobrada), mas será necessário aguardar numa fila imensa para passar nos raio-x e, pior ainda, será também obrigatório passar pela vistoria que é feita pelos guardas, que tentam impedir o grande pecado que aconteceria se alguma visitante entrasse com os ombros destapados ou com um palmo de perna sobre os joelhos à vista. Assim, é bom que as mulheres venham preparadas, evitando minissaias ou calções curtos, e com uma écharpe para cobrir os ombros. Chega a ser revoltante ver alguém ser barrado à entrada da basílica depois de ter estado numa fila enorme, e o pior é que estas medidas são sempre altamente discriminatórias em relação às mulheres, cujos trajes mais habituais na altura do Verão, são aqui reprimidos.
Mas é incontornável, quem quer entrar tem de cumprir estas regras, mesmo que absurdas, como o caso que presenciámos de uma mulher católica que pedia para entrar só para fazer uma reza, mas não foi autorizada porque estava com um top de alças... teria de sair, comprar um pano algures e voltar para a longa fila onde já tinha estado. Ora, neste mesmo local, uma muçulmana de cara tapada, ou mesmo de burca, não teria qualquer dificuldade em poder entrar.
Talvez sejam coisas como estas que afastam as gerações mais novas da igreja católica, e nem mesmo a mente mais aberta do Papa Francisco consegue alterar este tipo de coisas.
Os militares por quem tínhamos passado pertenciam à guarda italiana, mas, depois de entrarmos na zona mais restrita do Vaticano, passámos a encontrar alguns membros da sua polícia oficial, a Guarda Suíça Pontifícia. Desde o século XVI que esta força militarizada de elite tem vindo a garantir a segurança dos diversos Papas… parece estranho, mas, apesar daquelas fardas ridículas, a verdade é que a Guarda Suíça é uma tropa especial altamente preparada.
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Das diversas obras de arte com que a basílica se encontra decorada, esculturas e pinturas que são autênticas pérolas, destaca-se a mais bela de todas, a extraordinária Pietà de Michelangelo.
Uma estátua lindíssima feita em mármore pelo mestre no ano de 1499, e que representa, de forma extremamente expressiva, a cena bíblica em que a Virgem Maria segura nos seus braços o corpo do seu filho Jesus Cristo, já sem vida.
Museu do Vaticano e Capela Sistina
Na realidade, o Museu do Vaticano não é só um, inclui um conjunto de museus que se encontram divididos pelas diversas temáticas representadas. De qualquer forma, para mim, como para a maioria das pessoas, estes museus constituíram apenas o longo caminho que foi necessário percorrer para atingir aquilo que realmente queríamos visitar, e que era a Capela Sistina.
Mas não deixa de ser bastante interessante quando, ao longo do demorado percurso que temos de fazer para atingir o nosso destino, vamos encontrando salas e corredores com as mais preciosas obras de arte, com Botticelli’s, Caravaggio's ou afrescos de Raffaello que, por si só, já seriam imperdíveis, como acontece com a sua obra-prima, o Triunfo de Galatea, pelo qual passámos quase sem reparar.
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Para visitar o Vaticano e os seus museus, deve ser reservada, pelo menos, uma manhã ou uma tarde, pois há muita história e muita arte para conhecer ao detalhe… mas reconheço que, às tantas, já nos vai faltando a paciência para tanta arte e tanta cultura, e só queremos chegar depressa à Capela Sistina, que é a razão principal para ali estarmos.
Como já referi o Museu do Vaticano é formado por um conjunto de museus, onde se incluem, entre muitos outros espaços, a Galeria de Arte Egípcia, a Pinacoteca, com mais de 400 quadros dos maiores nomes, entre eles Raffaello, Leonardo da Vinci e Caravaggio, ou a Galeria dos Mapas, um imenso corredor com mapas do mundo pintados na parede durante o século XVI, mas onde se destaca sobretudo o seu teto magnífico.
Chegados finalmente à principal das capelas de todo o mundo, acabamos por ficar um pouco desiludidos por encontramos aquele local completamente apinhado de turistas. Mas é apenas uma primeira sensação que logo é substituída por um imenso fascínio, assim que nos abstraímos das pessoas e nos focamos nos afrescos deslumbrantes de Michelangelo que decoram as paredes e o teto da capela.
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Capela Sistina
Chegados finalmente à principal das capelas de todo o mundo, acabamos por ficar um pouco desiludidos por encontramos aquele local completamente apinhado de turistas. Mas é apenas uma primeira sensação que logo é substituída por um imenso fascínio, assim que nos abstraímos das pessoas e nos focamos nos afrescos deslumbrantes de Michelangelo que decoram as paredes e o teto da capela.
Apesar da quantidade de turistas que enchem a capela, o ambiente é razoavelmente silencioso, o que ajuda na concentração que é necessária para apreciarmos devidamente aqueles instantes. Mas, apesar de ser um local sagrado onde o silêncio é obrigatório, há quem não cumpra essa regra, o que leva a que os guardas repreendam os visitantes para se manterem calados, criando um ambiente algo tenso.
Essa tensão é ainda mais evidente quanto à proibição de se tirar fotos, mesmo sem flash. É algo que é quase uma obsessão por parte dos guardas, que abordam os turistas de forma antipática, o que acaba por nos deixar a todos um pouco desconfortáveis. Esta regra de proibição de fotografar tem vindo a tornar-se cada vez mais rigorosa, mas, em 2004, quando visitei pela primeira vez a Capela Sistina, só não era tolerado o uso do flash, o que me permitiu conseguir algumas fotos, como esta, que representa uma parte do imenso conjunto de afrescos que cobrem o teto da capela.
A construção da capela decorreu entre 1473 e 1481, durante o mandato do Papa Sisto IV, a quem se deve o nome de Capela Sistina. O arquiteto responsável pela construção foi Giovanni de Dolci, mas o que chama a atenção na capela não é a sua arquitetura, mas os afrescos que cobrem totalmente as paredes e o teto, e que foram maioritariamente criações de Michelangelo. A encomenda para a decoração da capela aconteceu mais tarde, já sob as ordens do Papa Júlio II, e os afrescos foram pintados entre 1508 e 1512, pelo mestre Michelangelo que dedicou mais de quatro anos da sua vida para criar aquela que viria a ser a sua obra-prima principal.
Ao longo da sua história a capela tem servido para os sucessivos conclaves, quando, depois da morte ou da renúncia de um Papa, os cardeais permanecem trancados na Capela Sistina para uma votação (supostamente) individual e secreta. No final de cada votação os subscritos são queimados na lareira da capela com um aditivo que faz com que o fumo seja negro, nos casos em que a votação não foi suficiente para se conseguir a eleição. Caso a votação tenha permitido a eleição de um novo Papa, o aditivo escolhido faz com que saia fumo branco pela chaminé da capela, e os fiéis, que aguardam ansiosos nas imediações do Vaticano, comemoram a nova eleição partilhando a expressão em latim “Habemus Papam”.
Voltando ao teto da capela, a obra é magnífica e sem precedentes, e constitui, sem grandes dúvidas, a mais bela criação do artista e talvez a mais preciosa peça de arte jamais concebida. Nas imagens que ocupam a faixa central do teto estão representadas as nove histórias do Génesis, desde a Embriaguez de Noé até a Separação da Luz e da Escuridão.
Mas a imagem mais conhecida é a que representa a Criação de Adão, localizada na parte central da abóbada e que revela o trecho da história do Génesis em que Deus deu vida a Adão, e onde Deus e Adão quase tocam os dedos.
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A escadaria de Giuseppe Momo, uma bonita escada em espiral construída em 1932, que nos leva à saída dos museus e que é frequentemente fotografada, conseguindo-se imagens sempre interessantes.
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Esta crónica baseia-se nas experiências de quatro viagens feitas em 1984, 1994, 2004 e em 2019, nas quais visitei o Vaticano e aos seus museus, locais sagrados e principais referências da igreja católica, mas também, espaços de concentração de arte e com uma riqueza histórica sem precedentes, e que sempre me fascinaram.