sábado, 15 de agosto de 2015

Uma Experiência Gastronómica


(15 de Agosto de 2015, no restaurante Vila Joya)

Por vezes a ida a um restaurante vai muito para além daquilo que a refeição nos oferece, proporcionando uma experiência que merece ser registada num espaço de memórias como este.

Dos muitos momentos gastronómicos que tenho vivido ao longo do tempo vou aqui registar a recente experiência no restaurante Vila Joya, na praia da Galé, no Algarve, não por ter sido a mais marcante, nem sequer a melhor, mas por ser a mais recente e por ter sido vivida num restaurante que está no topo do panorama dos restaurantes nacionais.

O 15 de Agosto de 2015 foi o dia escolhido para esta aventura, porque se pode considerar uma aventura, nem que seja por estarmos num dos melhores restaurantes do nosso país, pelo menos tendo em conta os galardões que lhe têm sido atribuídos, sendo um dos três restaurantes portugueses a que foram atribuídas duas estrelas Michelin e aquele que mantém esse título há mais tempo, há já perto de 15 anos. Assim, e mesmo que se avalie para além das escolhas da Michelin, é lógico considerar que o restaurante Vila Joya estará certamente em qualquer lista do top 10, ou mesmo do top 5, do nosso país. E foi mesmo considerado como o 22º melhor restaurante do mundo de 2014, de acordo com a classificação do “The World’s 50 Best Restaurants”.

Foi uma escolha feita com mais de um mês de antecedência, que nos deixou com a expetativa de que iríamos viver uma experiência, não só gastronómica mas também sensorial, admitindo que todos os sentidos se iriam agitar num local como aquele.

A marcação prévia começa por ser algo estranha, uma vez que é necessário deixar o número de cartão de crédito. Isto para o caso de não comparecermos ou de desmarcarmos com menos de 24 h de antecedência, situações em que nos seria cobrado o valor do menu.

Neste caso a equipa não desmarcou e avançou para a Praia da Galé no dia e à hora marcado e o show começou,……estava eu, Carlos Prestes, a minha mulher, Ana Prestes, a Sónia Fernandes Gião e o marido, Miguel Gião, a equipa de viajantes, neste caso, de comensais, que partiu para esta aventura.

A "Casa da Alegria", designação que está na origem do nome Vila Joya, é uma vivenda monumental de traça mourisca, com uma vista fantástica sobre a mata atlântica, o mar e a baía que define o contorno de uma praia de areias douradas, formando uma paisagem deslumbrante que prolonga o charme deste local.

O espaço de hotel e do restaurante é dominado por um clima de charme que nos encanta imediatamente quando lá entramos, com a sua decoração bem cuidada, num estilo entre o rústico e o romântico, e um ambiente acolhedor, entre o formal e o casual……um casual chique, claro. 

As mesas estavam dispostas no exterior sob um longo alpendre, envolvido pelas árvores do jardim e o mar em frente, a perder de vista, o que nos permitiu viver esta experiência ao ar livre, numa noite fantástica, com um céu estrelado e uma temperatura amena. O espaço era perfeito, a noite também, e nós avançámos para este desafio com um ótimo astral.
Depois das formalidades e apresentações, com entrega dos Menus e a explicação do conceito, terminaram com uma frase simbólica de acolhimento: Bem-vindos ao paraíso, bem-vindos ao Vila Joya!
Com a entrega do Menu, temos o primeiro contacto com os custos desta aventura. Estávamos preparados para preços elevados mas os instantes em que nos confrontamos com a sentença, são sempre algo perturbadores…..mas depois relaxamos e seguimos em frente. 

O menu regista o percurso que nos esperava com uma surpreendente simplicidade, focando apenas, de forma minimalista, alguns dos ingredientes fundamentais......sem adornos nem floreados.

Foi-nos proposto um menu de degustação, criação do Chef Dieter Koschina, que aliás era a única alternativa da noite, por um preço de 175 €, estrategicamente omitido das ementas distribuídos pelas nossas princesas, que, talvez por isso, continuavam a sorrir de forma inocente e inconsciente. 

Registo apenas que o menu de degustação de 105 €, que aparece referenciado em algumas páginas na net, ou a possibilidade de escolha “à la carte”, não estão disponíveis aos jantares, pelo menos nos períodos de época alta, como era o caso.

A escolha do vinho foi uma tarefa que também nos consumiu algum tempo, afinal, com uma carta em que a garrafa mais barata rondava os 50 €, justificava-se fazer render bem o peixe……pelo menos enquanto escolhíamos, não bebíamos......e lá deixámos que a nossa especialista em vinhos, a Sónia, trocasse opiniões abalizadas com o sommelier de serviço, tendo acabado pela seleção de um Quinta do Monte d’Oiro – Lybra Branco – um harmonioso lote de Viognier, Marsanne e Arinto, da região de Lisboa. 

E foi então que começaram a desfilar os pratos, ou momentos, como lhes preferem chamar, e que são de facto momentos sensoriais e não apenas de degustação…….são atos de apreciação, quase artística, de peças de inspiração criadas pelo Chef Koschina.

Para início da degustação, ainda fora dos pratos do menu, foram-nos servidas umas entradas de cortesia do Chef, os chamados amuse-bouche, como é comum neste tipo de restaurantes.

O primeiro era constituído por uma dose dupla para uma experiência em conjunto. 
Um primeiro prato era uma bonita concha de vieira envergando uma pérola de dimensão que a tornavam comestível, uma bola feita de patê concebido a partir do corpo do próprio bivalve, com uma cor prateada ligeiramente brilhante, recriando na perfeição a imagem de uma pérola verdadeira.
Ao mesmo tempo, numa outra taça, sobre uma pirâmide de gelo moído, surgiram numa espécie de tubos de ensaio de laboratório, uns consomês de maçã com rábano picante. Esta combinação é dominada sobretudo pelo contraste visual que proporciona, entre o aspeto natural da vieira e a imagem sofisticada do consomê, como uma explosão florescente que emana de uma espécie de vulcão em gelo moído, numa clara alusão visual à cozinha molecular. 

O aparecimento deste apontamento de uma conceção de comida dita molecular deixou-nos inclusive um pouco preocupados, temendo que essa fosse uma tendência atual deste Chef mas, na realidade, acabou por ser a única experiência da noite com estas tendências futuristas. 

Este momento foi uma espécie de aquecimento para o desfile de iguarias que nos esperavam e, neste caso, não tanto pelo prazer da degustação, mas muito mais pela conceção visual inusitada dos pratos servidos. 

O prato seguinte trazia-nos cinco apontamentos, cada um deles com uma profusão de paladares em combinações inacreditáveis. 
Do ponto de vista da degustação pura, foi uma das experiências mais tentadoras da noite, sobretudo pelo prazer da surpresa que cada prova nos proporcionava, à medida que os paladares se revelavam. Porém, nem conseguimos saber com exatidão aquilo que nos tinha sido servido……mas esse é um detalhe que será referido mais à frente, quando forem registados os pontos menos positivos.

Assim, limitámo-nos a usufruir do tremendo prazer proporcionado por algumas destas combinações de ingredientes criadas pelo Chef, embora desconhecendo uma parte daquilo que comíamos…..foi uma espécie de prova-cega, mas o problema é que não era para ser.

Reconhecemos os paladares de alguns ingredientes e era evidente a presença de um cone de massa fina e estaladiça com um delicioso tártaro de novilho. Foi um ponto alto desta noite, que seria brilhante se a ideia fosse mesmo fazer uma prova-cega…..ou então que nos tivesse sido explicado devidamente aquilo que nos serviram e não da forma atabalhoada como o fizeram.


No momento seguinte, marcando uma pausa antes do início do menu, trouxeram-nos uma bandeja com vários tipos de pão (pão português, pão com azeitonas, baguete, croissant, focaccia, etc), com azeite para molhar e uns quadradinhos de manteiga para barrar. A manteiga era claramente artesanal, com um paladar diferente da manteiga corrente e o azeite era transmontano, também bastante bom. Ao longo da refeição foram passando de novo com a bandeja de pão e foram reforçando os pratinhos de manteiga e azeite. 

Mais um comentário para o balanço final…..serviram-nos o azeite sem nos informarem o que estavam a servir. Foi preciso chamá-los de volta para que nos mostrassem o respetivo rótulo.


Entretanto a noite já tinha caído, deixando o céu salpicado de estrelas, e o local passou a ser dominado pela luz das velas nas várias mesas. Fizemos então uma primeira pausa, fomos até ao espaço dos fumadores e regressámos depois para desfrutar do menu de degustação principal.
E os pratos começaram a desfilar, principiando pelo “Hamachi, Funcho, Bergamota”.
Hamachi é um peixe semelhante ao atum (penso que é japonês mas nem sei se tem alguma correspondência em português). Neste prato, o Hamachi foi servido cru, cortado em sashimi, com uns fiapos de folhas e ervinhas, acompanhado por uns cubos de funcho, que é uma espécie de anis, com consistência de uma goma, e com um molho cremoso de bergamota, um tipo de tangerina.

Os paladares eram requintados e o peixe era suculento e saboroso, mas confesso que não foi um prato que me tivesse deslumbrado minimamente.

O prato seguinte era anunciado como “Burrata, Alcachofra, Trufa, Pata-Negra”.
Tirando os pedaços de alcachofra, os restantes ingredientes não podiam ser mais delicados. O presunto pata-negra com corte fino é sempre um pitéu fantástico. A burrata é um queijo italiano gourmet da região de Puglia, considerado um meio-termo entre a mozarela de búfala e a manteiga. Por fim as trufas, sempre delicadas e requintadas, surgem em películas finíssimas, de forma a moderar paladar intenso e dominante e, claro, limitar o custo astronómico.

Curiosamente, o resultado final do prato acabou por se revelar aquém da soma das partes. Talvez por causa do molho, meio aguado, o prato acabou por valer, não pela mistura e combinação dos paladares, mas por cada um dos componentes per si.....ou seja, o Chef aqui não se saiu muito bem.


Nova pausa para repor os níveis de nicotina, para os fumadores, claro, e voltámos à escolha de uma nova garrafa de vinho. Desta vez, depois de se repetir toda a misancene acabámos por escolher um elegantíssimo Quinta de S. José Tinto, um lote de Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz da região do Douro, que harmonizou na perfeição pelo equilíbrio entre a fruta, frescura e mineralidade, com o próximo prato de peixe mas também o principal prato de carne. Talvez por isso este vinho foi servido num copo de fundo mais largo para libertar os aromas mais depressa. 

Era agora a vez do “Pargo, Risoto de Frutos do Mar, Pesto”.
Neste caso o conjunto foi bem mais do que a soma das partes. Um lombo suculento de pargo foi servido numa cama de um risoto de frutos do mar delicioso, adornado e apaladado por alguns salpicos de pesto que, juntamente com parmesão do risoto, conferiam ao prato um paladar mediterrânico. Fora da ementa, mas como complemento do risoto, o prato incluía ainda uma deliciosa espetada de camarão em espeto de lemongrass (ou chá príncipe).

Esta foi, sem dúvida, uma das melhores experiências da noite. A escolha irrepreensível dos ingredientes, a arte da confeção e o equilíbrio dos temperos, produziu um conjunto de paladares perfeitamente deliciosos......uma autêntica peça de arte.


Depois deste ponto alto faltavam ainda dois pratos fortes, um misto, de marisco e carne, e um outro só de carne e, neste momento, as expetativas começavam a ficar elevadas. Surpreenda-nos Herr Dieter Koschina!

“Molejas de Vitela, Lagostim, Cenouras, Caril”, era assim que o menu assinalava o próximo momento de degustação. 
Chamam-se molejas às massas glandulares que se encontram nas vitelas novas, na parte anterior do peito, junto à traqueia. Aparecem neste prato sob o lagostim, envolvidas no molho de caril, imensamente suculentas e deliciosas. As cenouras miniatura são confeitadas em diferentes molhos, surgindo dessa forma, estaladiças e com tonalidades distintas. Um lombo de lagostim panado com uma cobertura crocante com sabor a caril dominava o prato, dando-lhe a densidade necessária para satisfazer o apetite. O conjunto levava ainda uns adornos, como um gomo de bergamota e um apontamento de tomilho fresco.

Se o prato anterior nos tinha agradado este deslumbrou-nos. Não só pela mistura dos sabores, do lagostim, das molejas, das cenouras, sempre ligados entre si pelo paladar suave e o aroma do molho de caril……mas também pela combinação das texturas e consistências, do panado crocante do lagostim, da carne suculenta da moleja e das cenouras estaladiças……foi perfeitamente fantástico……definitivamente, o melhor prato da noite. Aumentaram as expetativas para o entrecôte americano, já só esperamos o melhor do grande Chef.

Era a hora do prato forte de carne, “Entrecôte Americano, Rabanetes, Beterraba, Rábano Picante”. Embora reconheça que não sou apreciador do paladar da beterraba, com aquele sabor a terra, mas fiquei expectante pelo entrecôte, acreditando que seria divinal.
O naco de novilho aparece envolvido por um molho entre o roxo e o grená, pelo domínio cromático da beterraba. Infelizmente, e tal como temia, também os sabores foram totalmente dominados pela presença da beterraba e do rábano picante, que tem um paladar semelhante. E dessa forma já estava estragada a carne, mas isso era apenas uma opinião muito pessoal, porque não gosto do gosto da beterraba. Mas o flop ainda foi mais longe, porque o próprio entrecôte estava seco e passado demais. Nem todos comeram a totalidade do prato o que motivou alguma preocupação por parte de um dos chefes de mesa, insistindo em repetir o serviço, invocando que a carne terá tido um tempo de espera exagerado e terá secado um pouco mais do que devia.….mas, com 2 estrelas Michelin, era o mínimo que podiam ter feito……de qualquer forma acabámos por não mandar repetir o prato.

Vou registar aqui apenas a desilusão que este prato nos deixou, sobretudo porque estávamos à espera de uma carne suculenta, do mais suculento que se pudesse imaginar…….mais à frente, no balanço final desta noite, não poderei deixar de voltar a referir este sentimento de frustração.

Continuando, e sabendo que nas degustações a doçaria desempenha sempre um papel relevante, avançámos animados para as sobremesas. Começámos também por uma cortesia do Chef fora do menu.
Um doce de pipocas, como uma espécie de mousse, um pouco mais consistente, com alguns topings estaladiços. Não sou fã de pipocas nem acho que o seu paladar vá bem como doce.


Uma outra cortesia do Chef foi constituída por uma série de ingredientes sobre os quais não fomos sequer informados, admitimos que era um mimo surpresa. 
Tentámos perceber o que era, mas ao fim de quase 3 h a degustar já nos era difícil adivinhar. Percebemos que tinha uma base de chocolates e uns nuts crocantes…..e que era muito bom. 

Entrámos de novo na ementa para a sobremesa oficial do menu de degustação, “Pêssego, Framboesa, Champanhe, Chocolate Branco”.
Uma panóplia de frutos que são autênticos mimos, acompanhados por um gelado de champanhe delicioso. Um conjunto muito equilibrado de paladares, com grande requinte........realmente maravilhoso.

Para o café foi ainda servida uma pedra onde se dispunham diversas pérolas da doçaria.
Uns delicados bombons de mousse de maracujá, umas pequenas tartes de amêndoa caramelizada, umas gomas artesanais de tangerina e uns chocolates de caramelo e mousse de kumquat.......uma delícia! 


Ficámos ainda pela noite fora a terminar o vinho, ao som de um pianista bastante virtuoso, que nos foi acompanhando com um repertório muito bem escolhido.


Antes da saída foi-nos ainda oferecido um último brinde, um batom reproduzindo uma imagem perfeita de um batom verdadeiro, feito em chocolate branco e azuleta, com um paladar bem agradável. 

Terminou assim uma noite fantástica num paraíso anunciado, um serviço de quase quatro horas com várias maravilhas da degustação, que nos proporcionou um momento muito agradável e, indiscutivelmente, uma experiência inesquecível.

Porém.......e há sempre um porém, não posso deixar o registo desta experiência sem referir alguns dos pontos fracos que foram também surgindo ao longo da noite. Saliento que a nossa expetativa era a mais alta possível, mas penso que era legítimo que assim o fosse......num restaurante com duas estrelas Michelin tudo tem que ser irrepreensível......e era essa a nossa ideia. Só por isso, por termos colocado a fasquia tão alta, é que sentimos que alguns detalhes ficaram aquém da expetativa e, por isso, vou referir aqui alguns deles.

Começo pelo preço......aliás, se o preço não fosse tão exagerado talvez estas críticas fizessem menos sentido.....mas não, é tudo muito, muito caro. Começa logo pelo menu, a 175 €, mas depois é tudo caríssimo….uma água a 10 €, um café a 5, e sobretudo os vinhos…….é um autêntico escândalo aqueles preços da carta dos vinhos.

Mas com preços tão altos então que tudo o resto fosse impecável. Mas não, nem o próprio serviço, apesar de toda a misancene no momento em que cada prato é servido, a verdade é que raramente fomos acompanhados por um chefe de mesa que nos informasse com detalhe o que estava a ser servido em cada prato, e esperava mesmo que nos pudessem falar um pouco mais sobre os pratos, afinal são eles próprios que os consideram como peças de arte, por isso devia ter sido mantido um certo élan artístico (como aliás já encontrei noutros restaurantes), mas que aqui não se verificou minimamente. Quando nos descreviam o prato, o que nem sempre acontecia, limitavam-se a papaguear o que aparecia escrito no menu e, em alguns casos, a informação foi mesmo transmitida por um dos jovens estagiários que só falavam inglês.....e nós éramos uma das poucas mesas de portugueses que ali estava, deveriam ter tido o cuidado de nos abordar na nossa língua. Chegámos ainda a fazer perguntas a alguns funcionários que nos responderam que só o chefe de mesa sabia responder.....pareciam os serventes a dizer que quem sabe é o encarregado. Realço contudo, no sentido oposto, a forma bem atenciosa e simpática de como fomos atendidos pelo sommelier durante a escolha dos vinhos.

A própria comida também teve os seus pontos negativos. Não critico o resultado de alguns dos pratos, porque há gostos diferentes e, quando se trata de arte, nem todos gostamos do mesmo quadro nem da mesma escultura....ou do mesmo prato. Mas achámos pouco conveniente o episódio do entrecôte que, segundo a explicação, demorou um bocadinho mais e passou do ponto. Não pode acontecer....era um dos pratos fortes da noite, aquela carne tinha que ser suculenta, a desfazer-se na boca, senão não era preciso fazerem entrecôte americano, faziam um bife da alcatra bem passado. É verdade que se desculparam e sugeriram a repetição do prato mas, num sítio destes, mais do que em qualquer outro local, as desculpas não se devem pedir mas sim evitar.......imagine-se que éramos críticos da Michelin, ficaríamos satisfeitos com uma nova rodada para ver se desta vez acertavam no ponto da carne? Certamente que não!

O ambiente.......aqui já estou a entrar um pouco em contradição, porque no início desta crónica referi que tínhamos encontrado um ambiente excelente. Mas não há contradição nenhuma. O ambiente é muito agradável, mas não é de todo a nossa praia. Algo formal, casais estrangeiros de meia (e alta) idade, poucos portugueses, poucos jovens.....um tipo de frequência muito à medida dos preços praticados mas também por ser um hotel de luxo no Algarve. Outros restaurantes igualmente caros, mas em Lisboa ou no Porto, têm uma frequência onde nos integramos de forma mais natural.

Embora não seja fumador, registo também com desagrado que o espaço destinado aos fumadores fosse tão descuidado. Até parecia que o hotel e o restaurante seriam smokefree e por isso não existiria de todo um espaço de fumo. Mas não, aquele canto do jardim era mesmo o local destinado a uma pausa para um cigarro, em vez de um espaço nobre e acolhedor como se exigiria.

Uma outra crítica, talvez uma das mais lamentáveis, tem a ver com a casas de banho que, no final da noite, deixaram de estar minimamente em condições, além da limpeza do espaço, não haviam sequer toalhas limpas para secar as mãos…….pareciam os WC’s de um estádio de futebol no fim do jogo (talvez esteja a ser um bocado severo, mas as estrelas Michelin potenciam o meu grau de exigência e o meu desagrado). 

Apenas um último apontamento sobre este texto……as descrições dos momentos de degustação que fui fazendo ao longo desta crónica podem conter algumas incorreções e, ainda assim, só foram possíveis pela atenção com que explorámos cada prato e pela persistência junto do pessoal de mesa, para tentarmos saber aquilo que nos estavam a servir, porque se não fosse dessa forma, teria sido impossível fazer qualquer tipo de descrição pormenorizada.

E uma última crítica, é mais uma desilusão do que uma crítica, foi a ausência do Chef passando pelas mesas, como acontece habitualmente nos restaurantes estrelados. Mas o senhor se calhar nem estava lá.....e se calhar foi mesmo por isso que aconteceram algumas das falhas mencionadas. Sendo este desfile de sabores uma mostra artística do seu criador, o Chef deveria ter aparecido.....tal como acontece, por exemplo, nos desfiles de moda, onde é habitual a presença do estilista na passerelle, no final do show. Era disso que estávamos à espera.....tanto mais que o próprio restaurante valoriza bastante essa presença, tendo mesmo uma alternativa, a que chamam “À mesa com o Chef”, uma experiência que se pode apreciar por um custo de 225 €. Mas nós não queríamos jantar com o Chef, nem estávamos à espera que ele nos oferecesse uma flûte de Moët & Chandon.....só lhe queríamos dar as boas noites…..mas não nos foi dada essa oportunidade, o que nos desiludiu.

Mas ainda assim, mesmo sem Chef e com algumas falhas, foi uma noite inspiradora que certamente não iremos esquecer.


Carlos Prestes
Agosto de 2015


domingo, 12 de julho de 2015

Amesterdão


Conheci a capital holandesa no ano de 1984 e fiquei, naquela altura, completamente rendido. Não sabia sequer da existência de uma cidade cheia de canais, como uma Veneza do Norte (a internet fazia-nos muita falta), e fiquei completamente maravilhado quando ali cheguei.

Para ajudar ainda mais ao meu fascínio, decorriam naquele fim de semana vários eventos que enchiam a cidade de palcos com espetáculos de tudo e mais alguma coisa, e decorria também, a pouco mais de 30 km da cidade, em Zandvoort, o Grande Prémio da Holanda de Fórmula Um… o que fazia com que Amesterdão estivesse apinhado de gente numa festa permanente, durante o dia e pela noite fora.
Foi por isso que estive por lá três dias praticamente sem dormir, e fiquei com uma sensação muito clara de que Amesterdão passava a ser a minha cidade favorita… estatuto que se manteve durante um ano, pois no ano seguinte regressei à cidade, mas já não era fim de semana de festejos nem de Fórmula 1, e estava tudo muito mais calmo, e desde então, esta cidade passou a ocupar um lugar um pouco mais abaixo na lista das minhas preferências.

Desde essa segunda visita ainda voltei a Amesterdão mais duas vezes, e conto voltar em abril de 2025, fazendo sempre os mesmos percursos que nos levam a apreciar as paisagens inspiradoras que a cidade oferece, com uma imagem muito singular, com as casas típicas do Norte da Europa e com os seus canais.

No mapa seguinte assinalo os locais mais comuns que fui visitando, e os trajetos efetuados, que nos levam quase sempre pelas margens dos canais:
 


Central Railway Station

Sempre que fui a Amesterdão entrei na cidade pela estação ferroviária, onde chegam os transferes do aeroporto, e lembro-me bem quando ali cheguei pela primeira vez, e constatei que estava num mundo fascinante, a tal terra cheia de canais que não esperava encontrar.

Agora o efeito e o fascínio já não são os mesmos, mas não deixa de ser uma entrada triunfal, quando saímos da estação e contemplamos a dinâmica desta cidade.


Praça Dam e Palácio Real

Ao sair da estação continuamos sempre pela mesma rua, a Damrak, uma rua animadíssima que nos vai levar até a Praça Dam, uma das mais importantes da cidade.

Pelo caminho passamos junto ao edifício da Bolsa de Valores de Berlage, que constitui um dos marcos arquitetónicos locais. Desde a sua construção em 1903, este edifício desempenhou um papel fundamental na história económica e cultural da cidade, na época em que Amesterdão era um importante centro financeiro europeu.

E na altura da sua construção, o seu design era considerado bastante inovador, marcando uma transição nas correntes de arquitetura, saindo do estilo neogótico e renascentista, mais habitual nos grandes palácios, para um estilo mais funcional e precursor do modernismo.

A estrutura foi usada como bolsa de valores apenas até 1912, quando as operações financeiras foram transferidas para outro local, e este edifício passou a ter outras funções. Viveu também as perturbações inerentes à presença nazi na cidade, e é hoje um centro cultural onde ocorrem diversos tipos de eventos, exposições, feiras e conferências, e também alguns concertos e espetáculos, que aproveitam a excelente acústica do grande salão.
Pouco depois entramos na Praça Dam, a maior e mais icónica praça de Amesterdão, localizada bem no coração da cidade, e que constitui um ponto central, tanto para os moradores como para os visitantes.

A Praça Dam foi construída no século XIII e recebeu esse nome porque se encontra no local onde existia uma represa ("dam" em holandês) no rio Amstel, que foi essencial para o desenvolvimento da cidade.

Ao longo dos séculos, a Dam nunca deixou de ser um importante centro comercial, político e social de Amesterdão, e é por ali que se juntam os muitos milhares de turistas que visitam a cidade, em torno do Monumento Nacional, um obelisco de 22 metros de altura, construído em 1956 em homenagem aos soldados holandeses que perderam a vida durante a Segunda Guerra Mundial. Este obelisco deveria constituir um local de memória e reflexão, mas o que encontramos é mais um espaço para a partilha de charros e de garrafas de cerveja… que aqui serão maioritariamente da Heineken, produzida na cidade.
Em torno da Praça Dam vamos encontrar diversas atrações, como o Museu Madame Tussauds, uma delegação do famoso museu de cera inglês que oferece uma experiência interativa com as figuras moldadas em cera de celebridades e personalidades históricas.

Há também, em torno desta praça, uma imensa quantidade de lojas, restaurantes e cafés, que se vão enchendo durante todo dia com os milhares de visitantes que passam pela praça.

Mas o destaque principal deste espaço está reservado para uma igreja e um palácio.

A Nieuwe Kerk, que significa Igreja Nova em neerlandês, foi construída no final do século XIV, ou seja, apesar do nome de "nova", a igreja já conta com mais de 600 anos.

Inicialmente era uma igreja católica, como todas as igrejas da época nos Países Baixos, mas no século XVI, com a Reforma Protestante liderada por figuras como Martinho Lutero e João Calvino ganhou força nos Países Baixos e esta igreja haveria de se tornar num templo Protestante.

Atualmente, este espaço já não é usado para cultos religiosos, mas sim para acolher exposições, eventos culturais e cerimónias importantes, como a coroação dos monarcas holandeses e casamentos reais.
Ao lado desta igreja fica o Palácio Real de Amsterdão (Koninklijk Paleis), um edifício do século XVII, durante a idade de ouro holandesa, quando a cidade era uma das mais ricas do mundo, e que veio a ser convertido num dos palácios da família real.

Atualmente é um dos três palácios oficiais da Coroa dos Países Baixos que se encontra à disposição da família real holandesa.

O edifício foi projetado num estilo barroco holandês, inspirado na arquitetura romana e tem umas fachadas clássicas e pesadas, falta-lhe o requinte de outros edifícios, como os châteaux franceses.

Hoje em dia, este edifício é usado para receções oficiais, cerimónias de estado e eventos reais, e só se encontra aberto ao público durante algumas épocas do ano, quando os visitantes podem explorar as luxuosas salas e aprender um pouco mais sobre a sua rica história… como não sei quando é que se pode lá entrar, não vou conseguir dar grande ajuda, mas posso dizer que, através do site oficial do palácio, se pode fazer um tour virtual que nos leva a conhecer os grandes salões que se escondem por detrás das fachadas escuras e feias.
Virando à direita a partir do Praça Dam seguimos pela rua Raadhuisstraat, uma das ruas mais largas desta zona da cidade, até chegarmos ao canal de Prinsengracht, onde começa o Bairro Jordan.


Igreja Protestante - Westerkerk

A primeira atração desta zona é a Westerkerk, uma famosa igreja protestante construída no início do século XVII, que constitui um exemplo notável do estilo renascentista holandês.

A torre desta igreja atinge os 85 metros de altura, sendo a mais alta torre da cidade e, no seu topo, está apoiada a coroa imperial de Maximiliano I da Áustria, símbolo de Amsterdão.

Esta igreja tem uma ligação ao famoso pintor Rembrandt, que se encontra enterrado na sua envolvente, embora não seja conhecida a localização exata.

A torre da Westerkerk é mencionada no Diário de Anne Frank, quando Anne dizia que ouvia os sinos da igreja enquanto estava escondida no anexo secreto, onde a sua família se refugiou durante a Segunda Guerra Mundial.


Casa de Anne Frank

A menos de 100 m vamos encontrar a Casa-Museu de Anne Frank, e é possível que esta distância possa estar ocupada por uma longa fila de pessoas, esperando a sua vez para entrar no museu, o que é sempre um processo demorado, mesmo para os visitantes que tenham adquirido o ingresso previamente pela internet… e foi por isso que nunca consegui visitar este espaço.

Este museu foi criado em memória a Anne Frank, uma das vítimas mais conhecidas do holocausto, devido ao seu diário, que foi publicado pela primeira vez em 1947, pelo seu pai, Otto Frank, o único sobrevivente da família, e é hoje um dos livros mais traduzidos e lidos em todo o mundo.

O museu mostra a casa e o chamado “anexo secreto", onde Anne e a sua família se esconderam dos nazis por mais de dois anos durante a Segunda Guerra Mundial.

Além da família de Anne Frank, que eram judeus, estiveram ali escondidas mais quatro pessoas, também judeus, entre julho de 1942 e agosto de 1944, quando foram descobertos e deportados para campos de concentração.

Anne documentou todas as suas experiências no diário, descrevendo as suas emoções, medos e esperanças… e quem tiver ainda viva a memória do livro, vai achar este espaço bastante perturbador. Os visitantes podem ver o Anexo Secreto devidamente preservado, objetos pessoais e exposições sobre a vida de Anne, o holocausto e a perseguição aos judeus.


Bairro Jordan e Negen Straatjes

Nesta zona da Casa de Anne Frank estamos entre dois bairros muito charmosos, o Bairro Jordan e o Bairro das Nove Ruas (Negen Straatjes). Ambos concentram várias lojas de design e marcas locais, boutiques vintage, cafés, galerias de arte e restaurantes, e são constituídos pelos bonitos edifícios clássicos, com a arquitetura típica dos Países Baixos, formando um conjunto muito fotogénico, sobretudo quando se enquadram as fachadas dos edifícios com as imagens bucólicas dos canais.

O Negen Straatjesque é ainda mais bonito do que o Jordan, pois fica localizado entre quatro canais (Prinsengracht, Keizersgracht, Herengracht e Singel), e é constituído pelas pequenas ruas pitorescas que formam as margens desses canais, onde podemos apreciar algumas das mais bonitas vistas da cidade.


Ao percorrermos este bairro vamos desfrutando das bonitas paisagens dos canais e das casas estreitas do século XVII, que retratam a mais bela versão da cidade de Amesterdão.



De Krijtberg

Depois de atravessarmos todo o bairro das Nove Ruas chegamos a mais uma das igrejas da cidade, neste caso, uma igreja católica jesuíta, conhecida oficialmente como Igreja de São Francisco Xavier.

Foi construída no século XIX e é famosa pela sua arquitetura em estilo neogótico e pela sua presença marcante entre os edifícios históricos da cidade.

É ainda hoje uma importante igreja para a comunidade local católica, e é também muito visitada por turistas, que assistem às missas que são dadas em várias línguas, incluindo o inglês, sendo um ponto de encontro espiritual para os visitantes internacionais.


Internationaal Theater Amsterdam

Ao chegarmos à Leidseplein, uma das praças mais famosas da cidade, vamos encontrar o bonito edifício forrado a tijolo do Internationaal Theater Amsterdam (ITA).

O edifício original foi construído no século XVII, mas foi destruído por um incêndio em 1772, sendo o edifício atual o resultado da reconstrução em estilo neorrenascentista, feita entre 1892 e 1894.

Desde sua inauguração, tem sido utilizado como um dos mais importantes teatros da Holanda, servindo de casa à companhia Internationaal Theater Amsterdam, que apresenta permanentemente uma programação diversificada de teatro contemporâneo, peças clássicas e atuações de companhias internacionais.


Museumplein

A caminho da Praça dos Museus seguimos pelas margens de um canal onde podemos apreciar a imagem do belíssimo edifício de escritórios chamado de Agusta Westland, numa zona em que a margem oposta é ocupada por extraordinárias mansões apalaçadas.
De seguida, atravessamos sob os arcos que se formam no edifício do Rijksmuseum, e entramos no espaço amplo, com um lago, um jardim e um relvado imenso, que é chamado de Museumplein, ou Praça dos Museus.
O nome desta praça resulta da existência de dois dos principais museus da cidade, o Museu Van Gogh e o Rijksmuseum.


Museu Van Gogh

Trata-se de um museu dedicado à obra e vida do renomado pintor holandês Vincent van Gogh e é um dos museus mais importantes do mundo dedicado a um único artista.

O museu permite que os visitantes acompanhem o desenvolvimento da carreira artística de Van Gogh, desde os seus primeiros anos até às suas obras mais famosas criadas já nos últimos anos de vida.

É uma das atrações mais visitadas da cidade, pelo que, quem quiser garantir o ingresso, deverá adquiri-lo previamente através do site.

O museu mostra a maior coleção de obras de Vincent van Gogh, com mais de 200 pinturas, 500 desenhos e cerca de 700 cartas… algumas dessas obras são bastante famosas, como estas que fui fotografando durantes as três visitas que fiz ao museu.




Rijksmuseum

Das várias vezes que fui a Amesterdão visitei apenas uma única vez o Museu Nacional da Holanda, ou Rijksmuseum. É o museu mais importantes do mundo, dedicado à arte, história e cultura dos Países Baixos, mas, talvez por isso mesmo, acaba por não ser assim tão interessante para os visitantes não holandeses.

O edifício, que foi inaugurado em 1885, é majestoso e bastante bonito, com os tons avermelhados do tijolo, típicos desta região, e resulta da combinação de elementos góticos e renascentistas.



O museu expõe uma vasta coleção de obras-primas da chamada Idade de Ouro Holandesa, onde se incluem, por exemplo, alguns Rembrandt’s, como a Ronda Noturna ou A Noiva Judia, mas também de muitos outros pintores holandeses, como Johannes Vermeer, com o seu quadro mais conhecido, A Leiteira, uma obra-prima famosa pela sua iluminação e realismo, que retrata uma jovem que enche uma tijela de leite.


Além disso, o Rijksmuseum possui uma rica coleção de móveis, armas, navios em miniatura, e objetos que retratam a história holandesa desde a Idade Média até os tempos modernos… tudo coisas que não me despertam particular interesse.

Mas quem quiser visitar este museu deverá comprar os ingressos online para evitar as filas, e reservar, pelo menos, duas a três horas, só para conseguir explorar as coleções principais… o que será uma grande seca, na minha opinião, claro!


Vondelpark

Para quem quiser fazer uma pausa para descansar um pouco, estamos na proximidade do maior parque da cidade, o Vondelpark, um belíssimo espaço arborizado e relvado, com vários lagos e uma série de atrações.
E quem quiser depois beber uma das cervejas de fabrico local, ou entra num dos muitos bares que por ali se encontram, ou vai à origem do produto, a fábrica e museu da Heineken.


Heineken Experience

Trata-se de uma combinação de museu, parque temático e local de degustação, e será interessante para quem deseja conhecer mais sobre esta cerveja e se divertir ao mesmo tempo. É uma experiência leve, educativa e muito popular em Amesterdão

Este espaço funciona no edifício da primeira fábrica da cerveja Heineken, fundada em 1867, e a experiência começa por uma trajetória histórica sobre a origem desta marca até se tornar uma das cervejas mais famosas em todo o mundo.

Fala-se do processo de produção, mostra o fabrico da cerveja, desde os ingredientes, água, malte, lúpulo e levedura, até o produto final.

Oferece uma experiência interativa onde se simula que cada visitante é uma garrafa de cerveja ao longo de toda a linha de produção.

No final podemos tirar a nossa própria imperial, e terminamos com a degustação de algumas variantes, o ingresso geralmente inclui duas ou três bebidas.

O preço, em 2015, era de 18€, um pouco puxado para quem leve miúdos que não bebem, mas até aceitável, se compararmos com o custo de três cervejas em qualquer café.


Outros canais e pontes de Amesterdão

No percurso seguinte voltamos a entrar nos bairros mais bonitos da cidade, que são atravessados pelos canais mais pequenos, que aliás são os mesmos que contornam todo o centro histórico (Prinsengracht, Keizersgracht, Herengracht e Singel) e que são sempre bastante fotogénicos, pelas belas imagens das suas casas construídas em tijolo e dos canais, com as margens cheias de árvores.

Neste bairro destacam-se algumas bonitas pontes que atravessam as encruzilhadas de dois ou mais canais, como as chamadas Sete Pontes, que ficam no ponto de convergência entre os canais Keizersgracht e Reguliersgracht.


Os canais mais pequenos comunicam com o canal principal, o Rio Amstel, onde encontramos algumas pontes diferentes, com um mecanismo para erguer o tabuleiro, de forma a permitir a passagem de barcos de maior porte.

Uma dessas pontes levadiças sobre o Amstel é a Magere Brug, uma ponte icónica, que é famosa pela sua forma, mas também, pelo seu aspeto bucólico quando, à noite, fica iluminada por pequenas luzes.

De seguida atravessamos a praça Thorbeckeplein até entramos na Rembrandtplein.


Rembrandtplein

A Praça Rembrandt é uma homenagem ao pintor Rembrandt e é conhecida pela estátua do pintor ao centro, e por um conjunto de outras estátuas de bronze que representam vários soldados, da mesma época de Rembrandt.

A praça é um ponto obrigatório de paragem de todos os turistas, sobretudo à noite, devido à sua vida noturna, com bares e restaurantes.


Munttoren

Seguimos depois até junto da Munttoren, que em português significa Torre da Moeda. Esta torre histórica recebeu este nome no século XVII, quando foi utilizada como local de cunhagem de moedas, após um incêndio que destruiu parte da cidade.

A sua localização central, e o aspeto da torre bastante bonita, faz deste local uma das atrações turísticas mais famosas da cidade.


Bloemenmarkt

Muito próximo desta praça encontramos o Mercado das Flores, ou Bloemenmarkt, um imenso conjunto de bancas, algumas em plataformas flutuantes no canal, onde se vende uma infinidade de flores e plantas, e onde comprámos alguns bolbos de tulipas, que plantámos no nosso jardim, mas não pegou nada.
Este mercado ocupa grande parte da margem do canal Singel, onde se formam imagens bastante interessantes, enquadrando as bancas de flores flutuantes e as casas típicas por trás.


Begijnhof

O Begijnhof de Amesterdão é um pátio fechado que remonta ao início do século XIV e está localizado perto da animada Kalverstraat, no centro da cidade.

Ao atravessarmos uma porta um tanto anónima na Spuistraat entramos num pátio interno encantador, com várias casas pitorescas, jardins bem cuidados e uma igreja central, a Igreja Reformada Inglesa.

Begijnhof é um termo de origem neerlandesa, utilizado para descrever um tipo de comunidade religiosa que existia na Europa medieval.

Os membros desta comunidade eram mulheres que viviam num grupo religioso e se dedicavam a uma vida de oração, mas sem necessariamente fazerem votos permanentes de celibato.

Em pleno relvado deste pátio encontramos o Heilig Hartbeeld, uma Estátua do Sagrado Coração, que é um monumento religioso comum em certas regiões católicas, que representa a imagem de Jesus Cristo com o coração visível, simbolizando o amor divino pela humanidade.


Canal e Rua Rodin

Neste local estamos próximo de mais um dos canais principais da cidade, o Canal Rodin, que termina neste local e transforma-se numa das maiores avenidas, que nos vai conduzir até à Praça Dam.



Red Light District

Estamos agora no Bairro da Luz Vermelha, um dos principais ícones da cidade de Amesterdão, conhecido pelos bordéis, clubes de striptease e prostituição legalizada ou tolerada, com a particularidade de encontrarmos montras onde as prostitutas se expõem… bastante chocante, ainda hoje, mas principalmente nos anos 80, quando por lá passei pela primeira vez.

Mas este bairro vibra sobretudo durante a noite, com as luzes vermelhas refletidas nos canais, e com os néons em torno das vitrines onde as profissionais do sexo se exibem, à espera de captar clientes, muitas vezes adornadas com cortinas e decorações quase sempre em tons vermelhos.

Mas as placas de néon não estão só nas montras, encontram-se por todo o bairro, nos bares, nos clubes e nos típicos coffee shops locais, formando uma atmosfera colorida e inebriante.

Encontramos milhares de turistas de todas as partes do mundo, que vão percorrendo as ruas estreitas, alguns interessados num conhecimento mais intrusivo nesta zona, outros apenas para apreciar o ambiente, e eventualmente ir tirando algumas fotos (o que nem sempre é permitido).




Oude Kerk

Continuando ainda no mesmo canal do bairro da luz vermelha, aproximamo-nos de uma das maiores igrejas da cidade, a Oude Kerk, ou Igreja Velha, que é um dos edifícios mais antigos de Amesterdão.

Construída no início do século XIV, a igreja serviu como ponto central da vida religiosa e social da cidade. Foi construída em estilo gótico e possui janelas com belos vitrais, tetos de madeira e várias capelas menores ao redor do edifício principal.

Foi originalmente uma igreja católica, dedicada a São Nicolau, o santo padroeiro dos marinheiros, mas durante a Reforma Protestante no final do século XVI, a igreja passou para as mãos dos protestantes calvinistas.

Atualmente, esta igreja funciona principalmente como um espaço cultural e um marco histórico.


Nieuwmarkt

O Nieuwmarkt é uma praça localizada no centro, onde se destaca a Waag, um edifício histórico do século XV, uma espécie de um palacete que é um dos edifícios mais antigos de Amesterdão, que serviu originalmente como um dos portões da cidade e, posteriormente, como casa de pesagem para mercadorias.

A área ao redor do Nieuwmarkt é movimentada, com muitos cafés, restaurantes e bares, tornando-se um ótimo ponto de encontro tanto para locais quanto para turistas, e o próprio Waag, funciona também como restaurante.

O Nieuwmarkt mantém ainda uma tradição de mercado de rua, onde se comercializam produtos frescos, livros, antiguidades e artesanato. No verão, é comum haver por ali alguns festivais de música e outros eventos ao ar livre.


Basilica de Saint Nicholas

Ao nos aproximarmos da zona da estação ferroviária, vamos encontrar mais uma das grandes igrejas locais, a Basílica de Saint Nicholas, a principal igreja católica da cidade.

Foi construída no final do século XIX, combinando elementos de neorrenascimento e neobarroco, o que a torna uma obra impressionante e muito distinta.

É dedicada a São Nicolau, o padroeiro dos marinheiros e da cidade de Amesterdão, o que faz sentido, considerando a forte conexão marítima desta cidade.

O interior da basílica conta com uma decoração rica, incluindo vitrais coloridos, esculturas e afrescos, com destaque para o altar principal e para a cúpula.

Atualmente, além de serviços religiosos, esta igreja serve também para a realização de concertos de música clássica, tirando partido da sua excelente acústica.


Cruzeiros pelos canais de Amesterdão

Os cruzeiros pelos canais de Amesterdão são uma das atrações mais icónicas da cidade e uma excelente maneira de podermos explorar o seu centro histórico e, para isso, encontramos vários locais onde se promove este tipo de oferta, embora a maior concentração de cruzeiros aconteça no canal que fica junto à Central Railway Station.
Existem várias alternativas, quer de durações, geralmente entre 1 hora a 1 hora e meia, e também de preços, que variam em função da oferta, que pode incluir uma experiência gastronómica com snacks, degustação de queijos holandeses e vinhos, ou mesmo um jantar completo.

Em qualquer dos casos, e seja de dia ou de noite, este tipo de passeio é algo que devemos fazer pelo menos uma vez na vida.
O barco leva-nos por um conjunto de canais no centro, onde podemos apreciar a arquitetura típica local, e também toda a mise-en-scène que se forma ao longo dos canais.


Todos os cruzeiros incluem audioguias com explicações sobre a história e arquitetura dos canais, e levam-nos também pelos canais mais largos, onde nos são desvendadas algumas das construções mais modernas, como o Museu Nemo, um popular museu interativo de ciências, o Passenger Terminal Amsterdam, o terminal de navios de cruzeiro, ou ainda o edifício do Eye Filmmuseum, um importante centro cultural dedicado ao cinema e às artes audiovisuais.




OBA Oosterdok - Public Library

Ao chegarmos de novo junto à estação ferroviária podemos agora aproveitar uma dica que aqui vou deixar. A ideia é visitarmos a biblioteca pública local, o que nos permitirá fazer uma pausa para ir à casa de banho e aproveitar uma belíssima vista sobre a cidade… e de forma gratuita.

A OBA Oosterdok foi Inaugurada em 2007 e é uma das maiores bibliotecas da Europa. Esta biblioteca pública está localizada nas docas orientais, a uma curta distância da Estação Central, e possui vários andares com milhões de livros, mais de mil assentos e um teatro para 300 pessoas, e funciona 90 horas por semana (o que é o dobro do horário médio de funcionamento das bibliotecas convencionais na Europa).

O edifício da OBA é impressionante, um prédio espaçoso e moderno, com grandes janelas que proporcionam luz natural e vistas panorâmicas da cidade.
O acesso é livre e será sempre um privilégio podermos visitar este mundo imenso dos livros, que atrai leitores e turistas… mas o melhor de tudo é quando chegarmos ao sétimo andar, onde há um café-restaurante com um terraço, de onde podemos apreciar uma vista panorâmica espetacular sobre a cidade.


Os coffee shops

Os coffee shops de Amsterdão são estabelecimentos legais onde é permitido o consumo de canábis, conforme as leis da cidade e dos Países Baixos. Esses locais oferecem uma experiência única, combinando a cultura do café com o consumo responsável de erva.

Quando das minhas primeiras visitas à cidade, esta liberalização não tinha ainda sido consagrada na lei, mas não era por isso que a canábis não passava de mão em mão, constituindo, já na altura, um atrativo para um certo tipo de turismo. Os charros eram comercializados e consumidos em todo o lado, sem qualquer secretismo.

Nunca tive interesse nenhum em experimentar estes cigarros que fazem rir, até porque nunca fumei cigarros convencionais e, mesmo que quisesse, não saberia como fumar uma coisa destas, e ficaria numa tosse pegada.

Com estas lojas, onde é permitido vender até cinco gramas de canábis por pessoa, por cada dia, o movimento de compra e venda na rua, deixou de ser tão visível... mas o consumo continua por toda a parte, deixando a atmosfera da cidade impregnada pelo cheiro dos charros, o que, para as minhas filhas, que estavam connosco na visita de 2015, é ainda hoje identificado imediatamente como "cheiro a Amesterdão".

E nós, turistas não consumidores, podemos e devemos entrar num destes coffee shops, onde se pode tomar apenas um café (mas não qualquer tipo de álcool, que não é vendido nestes estabelecimentos), e podemos também experimentar algumas alternativas de artigos recreativos feitos com canábis, não só os cigarros, mas rebuçados, diversos tipos de cookies e até umas fatias de bolo de chocolate… essas talvez bem mais tentadoras.

Para entrar nestes cafés é necessário ter mais de 18 anos e, em muitos lugares, é mesmo exigido um documento de identificação para verificar a idade. Além disso, o consumo de canábis é restrito ao interior dos estabelecimentos ou em áreas designadas.

Assinalei no mapa a localização de alguns coffee shops que se encontram por toda a cidade e variam bastante no seu estilo, desde os espaços modernos e descontraídos até aos locais mais tradicionais, sendo que alguns deles têm uma fachada bastante discreta e quase não se dá por eles, enquanto outros estão bem evidentes, com os seus letreiros de néon.
Um dos estabelecimentos de referência, localizado no coração do Red Light District, é o The Bulldog The First, fundado em 1974, quando a canábis ainda era ilegal, sendo o coffee shop mais antigo da cidade e mundialmente famoso, pelo que será certamente um dos mais movimentados, especialmente ao fim de semana.

Termino assim esta visita à cidade de Amesterdão, que já fiz algumas vezes, normalmente durante dois dias, mas que pode ser feita de forma mais demorada, se tivermos tempo e quisermos explorar detalhadamente os recantos desta cidade.

Amesterdão começou por ser o meu local favorito em toda a Europa, numa primeira visita em que a cidade mais parecia um parque de diversões, e que me deixou completamente fascinado. Mais tarde, a cidade desceu à terra, mas nunca deixou de ser um local extraordinário, onde regresso sempre que posso, nem que seja só aproveitando uma escala mais demorada no aeroporto… vale sempre a pena regressar a este sítio, meio frenético, meio encantado, nem que seja apenas para reavivar as memórias de toda uma vida.


Abril de 2015
Carlos Prestes